SSE #188: DIETAS VEGETARIANAS E VEGANAS PARA TREINAMENTO E PERFORMANCE ATLÉTICA
Publicado em
December 2018
Autor
D. Enette Larson-Meyer, PhD, RD, CSSD, FACSM
PONTOS-CHAVE:
- Dietas vegetarianas são selecionadas por atletas para a sua utilização por diversas razões incluindo saúde, questões ambientais, éticas, filosóficas, religiosas/espirituais e estéticas.
- Apesar das pesquisas sugerirem que dietas veganas e vegetarianas “plant-based” (à base de alimentos de origem vegetal) podem oferecer muitos benefícios à saúde dos atletas e não-atletas de maneira igual, atualmente existe pouca evidência de que dietas vegetarianas sejam melhores que dietas onívoras na melhora do treino e performance atlética.
- Atletas de todos os níveis, desde jovens atletas, recreacionais até atletas de elite, podem atingir suas necessidades de energia e nutrientes com uma dieta vegana ou vegetariana que contenha uma variedade de alimentos, incluindo grãos, frutas, hortaliças, alimentos de origem vegetal ricos em proteínas, e (se desejado) laticínios e ovos.
- Atletas com alta demanda energética podem precisar realizar refeições e lanches frequentemente e limitar alimentos ricos em fibras. Atingir a necessidade de energia é crucial para obter nutrição adequada para otimizar as adaptações aos treinos e à performance.
- Certos nutrientes incluindo as proteínas, ácidos graxos ômega-3, cálcio, vitamina D, ferro, zinco, iodo, vitamina B12 e a riboflavina são encontrados em menor quantidade em plantas, em comparação com alimentos de origem animal, ou são bem menos absorvidos. A seleção de alimentos contendo estes nutrientes normalmente garante um estado nutricional adequado; no entanto, a suplementação criteriosa com estes nutrientes pode ser necessária ocasionalmente.
- Como a maioria dos atletas, atletas vegetarianos podem se beneficiar com a educação sobre melhores escolhas alimentares para otimizar sua saúde e performance.
INTRODUÇÃO
A escolha dos atletas em seguir dietas vegetarianas acontece por razões de saúde, questões ambientais, éticas, filosóficas, religiosas/espirituais e estéticas, o que pode incluir o fato de não gostar de carne. Apesar das dietas vegetarianas terem boa aceitação na área da saúde pública, alguns técnicos e profissionais expressam a preocupação de que atletas vegetarianos podem não estar recebendo a nutrição adequada necessária para otimizar os treinos e performance. Na verdade, atletas vegetarianos, desde atletas recreacionais até os de elite, podem atingir suas necessidades de energia e nutrientes com os diversos tipos de dietas vegetarianas (Tabela 1). Os atletas podem, ao mesmo tempo, diminuir o risco para doenças crônicas (Dinu et al., 2017; Melina et al., 2016) e melhorar sua habilidade para atingir uma performance ideal ou recuperarem-se de exercícios extenuantes. Para garantir a performance ideal, atletas vegetarianos precisam consumir energia adequada e selecionar alimentos ricos nos nutrientes mais importantes (“red flag”), que podem ser encontrados em menor quantidade nos alimentos vegetarianos ou podem ser menos absorvidos a partir de fontes vegetais em comparação com as fontes animais. Como a maioria dos atletas, atletas vegetarianos podem se beneficiar com a educação nutricional e sobre melhores escolhas alimentares para otimizar sua saúde e performance (Melina et al., 2016; Thomas et al., 2016).
Tabela 1. Tipos de dietas vegetarianas.
Tradução:
Vegana (rigorosamente vegetariana) | Exclui todos os produtos animais incluindo laticínios e ovos; pode excluir o mel. |
Vegetariana | Evita todos os alimentos derivados da carne; pode ou não consumir ovos ou laticínios. |
Lacto-vegetariana | Inclui o leite ou outros laticínios mas não os ovos ou outros produtos animais. |
Ovo-vegetariana | Inclui os ovos mas não os laticínios. |
Lacto-ovo-vegetariana | Inclui os ovos e laticínios. |
Este artigo irá discutir a utilização de dietas vegetarianas entre os atletas, revisar as necessidades de energia e nutrientes dos atletas e indivíduos ativos e abordar as vitaminas e minerais específicos que podem estar faltando em uma dieta vegetariana mal planejada. Dicas do que os profissionais da saúde devem considerar para quando trabalharem com atletas vegetarianos também são abordadas.
DIETAS VEGETARIANAS EM PERSPECTIVA
TENDÊNCIAS EM RELAÇÃO ÀS DIETAS VEGETARIANAS
Apesar do interesse em dietas “plant-based” (à base de alimentos de origem vegetal) entre os atletas não ser um fato novo (Grandjean, 1987; Longo et al., 2008; Nieman 1988), parece haver um aumento recente na popularidade destas dietas entre os atletas, particularmente as dietas veganas (Tabela 1). Pouco se conhece, no entanto, sobre a prevalência do vegetarianismo entre os atletas. Entre a população em geral, enquetes recentes de abrangência nacional nos Estados Unidos, sugeriram que ~3,3% dos adultos são vegetarianos (relatam nunca ingerirem carne, frango ou peixe) e aproximadamente 46% dos vegetarianos são veganos (Vegetarian Resource Group, 2014; 2016). A mesma enquete revelou que 6% dos jovens adultos com idades entre 18 e 34 anos eram vegetarianos ou veganos enquanto uma enquete anterior encontrou especificamente que entre os jovens ~5% dos alunos do 1º ao 3º ano do ensino médio e do 9º ano do fundamental eram vegetarianos ou veganos (Vegetarian Resource Group, 2014). Ao contrário, apenas 2% dos indivíduos com 65 anos ou mais eram vegetarianos. Entre os atletas, uma pesquisa com participantes dos jogos Commonwealth encontrou que 8% dos atletas internacionais relataram consumir dietas vegetarianas, com 1% sendo veganos (Pelly & Burkhart, 2014).
POTENCIAIS BENEFÍCIOS DAS DIETAS VEGETARIANAS
Dietas vegetarianas podem ter muitas vantagens em relação à saúde quando comparadas às típicas dietas ocidentalizadas. As dietas vegetarianas e veganas estão associadas com risco reduzido para uma variedade de doenças crônicas incluindo obesidade, hipertensão, hiperlipidemias, doenças cardiovasculares, diabetes tipo 2 e acima de tudo mortalidade por câncer (Melina et al., 2016; Thomas et al., 2016). Sabe-se um pouco menos sobre a habilidade destas dietas em melhorar os treinos e performance esportiva (Craddock et al., 2016; Nieman, 1988; et al., 2016). Resultados de estudos observacionais e intervencionais a curto-prazo nos quais os indivíduos consumiram dietas vegetarianas ou não-vegetarianas por um período de testes de diversas semanas não detectou diferenças nos parâmetros de força, performance aeróbica e anaeróbica baseados na presença ou ausência de alimentos derivados de animais (na maioria carnes) (Craddock et al., 2016). No entanto, foram levantadas hipóteses de que dietas vegetarianas auxiliam os atletas a otimizarem seus treinos e performance (Craddock et al., 2016) devido ao naturalmente alto conteúdo de carboidratos (Nieman, 1988), antioxidantes e outros fitoquímicos (Trapp et al., 2010), e até mesmo o metal terroso estrôncio alcalino (Longo et al., 2008). Dietas vegetarianas podem também gerar vantagem ergogênica por induzir uma leve alcalinidade sérica durante o exercício (Hietavala et al., 2015). O alto teor de antioxidantes, em particular, pode ajudar a reduzir o estresse oxidativo associado ao exercício prolongado e a modular a função imunológica e anti-inflamatória (Trapp et al., 2010). Não está ainda estabelecido, no entanto, se o consumo a longo-prazo de uma dieta vegetariana iria melhorar a recuperação, prevenir lesões inflamatórias (ou por excessos), e atenuar o dano oxidativo que ocorre no treinamento intenso (Trapp et al.,2010), ou se a indução da alcalinização seria suficiente para tamponar a produção ácida durante o exercício intenso, e portanto, melhorar a performance atlética (Hietavala et al., 2017). Apesar do potencial ergogênico, no entanto, uma dieta vegetariana pode também ter o potencial de prejudicar tanto a saúde quanto a performance se as escolhas alimentares forem consistentemente abaixo das escolhas ideais.
CONSIDERAÇÕES NUTRICIONAIS E RECOMENDAÇÕES
ENERGIA E MACRONUTRIENTES
Energia: Atender as necessidades de energia é uma prioridade nutricional para todos os atletas (Thomas et al., 2016). O consumo inadequado de energia impede os benefícios do treino, compromete a performance e pode resultar em complicações na saúde que incluem a perda de massa muscular e/ou densidade óssea, e um risco aumentado de fadiga, lesões e doenças. As necessidades de energia variam individualmente entre os atletas de acordo com o esporte específico, intensidade e periodização das atividades de treinamentos nos quais os atletas participam (que provavelmente variam de acordo com o dia e ao longo da temporada). Outros fatores de influência incluem sexo, idade e composição corporal. Alguns atletas vegetarianos e veganos podem não atingir suas necessidades de energia devido à alta quantidade de fibras e baixa densidade energética das dietas à base de alimentos de origem vegetal (“plant-based”) combinadas com a alta demanda de energia e/ou calendários super ocupados que dificultam momentos adequados para se alimentar. Atletas com altas necessidades de energia deveriam ser encorajados a ingerir lanches e refeições frequentes (por exemplo, ~5-8 refeições/lanches/dia) e planejar adequadamente para que alimentos e lanches estejam prontamente disponíveis. Por exemplo, lanches ou mini-refeições embalados na bolsa de treino, mochila, mantidos no armário do vestiário ou na gaveta da mesa fornecem rapidamente a energia disponível nos alimentos. Uma seleção de alimentos ricos em energia e com limitação de alimentos com alto teor de fibras podem também ajudar a atingir as necessidades de energia. Por exemplo, substituir algumas porções de fruta por sucos de fruta e consumir de um terço até metade dos grãos, cereais e pães na forma menos processada, como o arroz branco e pão de fermentação natural ao invés do arroz integral e pães integrais irá reduzir o consumo excessivo de fibras e o início antecipado da saciedade (Grandjean, 1987; Larson-Meyer, 2007). Por outro lado, outros atletas vegetarianos podem necessitar de menor consumo energético para promover a redução lenta e sustentável do peso por razões de saúde e/ou de performance. Estes atletas podem se beneficiar de uma ênfase na seleção de alimentos integrais, não processados para promover saciedade e ajudar a atingir um peso corporal saudável.
Tabela 2. Exemplo de cardápio lacto-ovo-vegetariano e vegano com 3.000kcal.
Tradução:
Lacto-ovo-vegetariano | Vegano | |
Café da manhã
~50g de cereais ~50g de proteínas ½ xíc. de hortaliças 1 xíc. de fruta ½ xíc. laticínio/equivalente |
2 fatias de torradas integrais
Manteiga & 1 colher de sopa de geleia de fruta 2 ovos mexidos ½ xíc. pimentão & espinafre 1 xíc. suco de laranja Café com leite feito com ½ xíc. de leite |
2 fatias de torradas integrais
Margarina & 1 colher de sopa de geleia de fruta ½ xíc. Tofu mexido ½ xíc. pimentão & espinafre 1 xíc. de suco de laranja fortificado com cálcio Café com leite feito com ½ xíc. de leite de soja |
Almoço
~50g de grãos ~50g de proteínas 1 xíc. hortaliças 1 xíc. frutas ½ xíc. laticínio/equivalente |
2 fatias de pão de fermentação natural
2 xíc. sopa Minestrone (feita com ¼ xíc. grão de bico, ¼ xíc. feijão vermelho, 1 xíc. hortaliças variadas & azeite de oliva) coberta com 15g de queijo parmesão 1 maçã grande |
2 fatias de pão de fermentação natural
2 xíc. sopa Minestrone (feita com ¼ xíc. grão de bico, ¼ xíc. feijão vermelho, ¾ xíc. hortaliças variadas/¾ xíc. couve & azeite de oliva) 1 maçã grande |
Lanche
~50g de cereais ~25g de proteínas ½ xíc. laticínio/equivalente |
½ bagel grande (50g) integral
1 colher de sopa de pasta de amendoim 1 xíc. leite |
½ bagel grande (50g) integral
1 colher de sopa de pasta de amendoim 1 xíc. leite de soja |
Jantar
~115g de grãos ~50g de proteínas 2 ½ xíc. hortaliças |
4 Tacos de lentilha (feitos com lentilha, molho de tomate, tomate enlatado, cebola, salsão e óleo de canola em tortilha de milho macia servidos com alface, tomates frescos, jicama, abacate e salsa) | 4 Tacos de lentilha (feitos com lentilha, molho de tomate, tomate enlatado, cebola, salsão e óleo de canola em tortilha de milho macia servidos com alface, tomates frescos, jicama, abacate e salsa) |
Lanche
1 xíc. laticínio/equivalente |
1 xíc. iogurte
½ xíc. frutas vermelhas ou pêssego fatiado |
1 xíc. iogurte de arroz
½ xíc. frutas vermelhas ou pêssego fatiado |
Lanche associado ao exercício | Bebida de reposição de líquidos, gel esportivo, barras esportivas etc. | Bebida de reposição de líquidos, gel esportivo, barras esportivas etc. |
Muitos materiais com diretrizes alimentares publicamente disponíveis direcionados aos atletas, vegetarianos ou público em geral podem ser úteis para ajudar na educação de atletas vegetarianos e veganos em relação aos padrões alimentares saudáveis que atingem as necessidades energéticas. Estes incluem o “MyPlate” (Meu Prato) da USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos), que tem ajustes para as necessidades de energia e dicas para dietas vegetarianas, o “Athlete’s Plate” (Prato do Atleta) do Comitê de Esportes Olímpicos dos Estados Unidos (the United States Olympic Committee Sports), que é baseado na fase do treino e facilmente adotado para padrões vegetarianos (The United States Olympic Committee Sports Dietitians; The University of Colorado Sports Nutrition Graduate Program, 2006), e as diretrizes desenvolvidas especificamente para atletas vegetarianos (Larson-Meyer, 2007). Planos alimentares específicos para vegetarianos ou veganos, como o “My vegan Plate” (Meu Prato Vegetariano) do Grupo de Recursos para Vegetarianos (Vegetarian Resource Group, 2011), podem também oferecer uma estrutura útil se o número de porções for ajustado apropriadamente para atingir a alta demanda de energia de muitos atletas. Um exemplo com cardápios de 3.000kcal criados para atletas vegetarianos e veganos utilizando o “MyPlate” da USDA como modelo está disponibilizado na Tabela 2.
Carboidratos: Carboidratos são um componente importante da dieta de um atleta e deveriam ser a maior parte (maior volume) do seu consumo de energia. A ingestão de carboidratos é essencial para a performance ótima durante exercícios prolongados de intensidade moderada a alta com duração maior que ~90 minutos e durante atividades intermitentes intensas, que são típicas de muitos esportes (Burke et al., 2011, Thomas et al., 2016). Os carboidratos são também necessários na reposição de glicogênio após o exercício e para garantir adaptação adequada aos treinos. A quantidade de carboidratos que vegetarianos ativos precisam ingerir varia, dependendo do esporte, intensidade e massa corporal (MC). As recomendações atuais de carboidratos são 5-10g de carboidrato/kg MC/dia para a maioria dos atletas com performance em exercícios com intensidade moderada a alta por ~1-3 horas/dia (Thomas et al., 2016). Ingestões menores de 3-5g/kg MC são sugeridas para atletas desempenhando treinos baseados em habilidades ou de intensidade baixa enquanto quantidades maiores de 8-12g/kg MC são recomendadas durante treinos extremos de resistência (Burke et al., 2011; Thomas et al., 2016). Apesar da dieta vegetariana típica ter grande quantidade de carboidratos, a importância de atingir a quantidade adequada de carboidratos é enfatizada aqui em razão da recente popularidade das dietas “low carb” que também podem ser “atraentes” para certos atletas vegetarianos. Atletas vegetarianos, como todos os atletas, deveriam ser educados sobre os tipos certos de carboidratos a serem ingeridos nos momentos próximos à uma sessão de exercícios.
Proteínas: As necessidades de proteínas variam de acordo com o nível de treino e tipo de atividade. Um atleta em treinamento intenso vai precisar de mais proteínas que uma pessoa que é recreativamente ativa e se exercita moderadamente diversos dias na semana. A recomendação de ingestão diária (Recommended Dietary Allowance – RDA) dos Estados Unidos de 0,8g de proteína/kg MC deveria atender as necessidades da maioria das pessoas que se exercitam numa intensidade leve a moderada na maioria dos dias da semana (Otten et al., 2006). Os atletas que treinam com maior intensidade geralmente precisam de mais proteínas. Pesquisas recentes sobre as necessidades de proteínas de atletas sugerem que as proteínas dietéticas interagem com o exercício fornecendo não apenas substratos para a síntese de proteínas contráteis, estruturais e metabólicas mas também servem de gatilho para a síntese de proteínas musculares (Phillips & van Loon, 2011; Thomas et al., 2016). A recomendação de consumo de proteínas atual para atletas é de 1,2-2,0g de proteínas/kg MC/dia (Thomas et al., 2016) o que é recomendado para auxiliar a adaptação metabólica, reparos, remodelação e turnover de proteínas.
Existe pouca evidência para sugerir que as necessidades de proteínas para atletas que seguem dietas vegetarianas sejam diferentes daqueles que seguem dietas onívoras, particularmente devido à grande variação sugerida pelas necessidades de proteínas atuais para atletas. Para garantir um consumo adequado de proteínas, atletas vegetarianos deveriam ser encorajados a consumir uma variedade de alimentos ricos em proteínas de origem vegetal e garantir consumo adequado de energia. Boas fontes de proteína vegetais (>7g de proteínas/por porção) são mostradas na tabela 2, no entanto, é importante lembrar que todos os grãos, cereais e legumes ricos em amido também contribuem com pequenas quantidades de proteínas (2-3g/porção). Os vegetarianos não precisam consumir combinações específicas de proteína à base de vegetais em cada refeição, mas deveriam consumir uma variedade de fontes de proteínas espalhadas ao longo do dia (Melina et al., 2016; Young & Pellett, 1994). Uma exceção pode ser no período pós-exercício para atletas em treinos intensos de musculação onde uma certa concentração sérica de leucina e ~10g dos ácidos essenciais podem ser necessários para otimizar a síntese de proteína muscular no período imediatamente após o exercício (Phillips & van Loop, 2011; Thomas et al., 2016). Muitas proteínas de origem vegetal incluindo as leguminosas são ricas em leucina, apesar de não serem absorvidas tão bem quanto a “whey protein”. Além disso, combinações culinárias usuais de proteínas como o arroz e feijão, leguminosas e castanhas/sementes (por exemplo, no hommus) ou sanduíche com pasta de amendoim tendem a ser complementares (Young & Pellett, 1994).
Gordura: As diretrizes de ingestão de gordura para atletas deveriam estar em concordância com as diretrizes de saúde pública, e baseadas na individualização em relação aos objetivos dos treinos e composição corporal (Thomas et al., 2016). A gordura da dieta é necessária para fornecer energia, elementos das membranas celulares e ácidos graxos essenciais, e para auxiliar na absorção das vitaminas lipossolúveis. A gordura estocada nos músculos ativos e adipócitos é utilizada como substrato durante exercício prolongado com intensidade moderada e durante atividades de intensidade baixa. E ainda, fontes dietéticas de ácidos graxos essenciais deveriam ser enfatizadas para atender as recomendações de ingestão e a gordura saturada ser limitada à menos de 10% da ingestão total de gorduras (Departamento Americano de Saúde e Serviços Humanos e Departamento Americano de Agricultura, 2011). A baixa ingestão crônica de gordura abaixo de 20% da energia total e as estratégias que promovem dietas com baixa ingestão de carboidratos e ricas em gordura para possíveis benefícios na performance são desencorajadas (Thomas et al., 2016). Apesar das dietas veganas extremamente baixas em gorduras (<10% da energia obtida da gordura) serem recomendadas para a prevenção e tratamento de doenças cardiovasculares e diabetes (McDougall et al., 2014), tais dietas são excessivamente restritivas para atletas que participam de regimes intensos de treinos. A tendência popular atual da adaptação à gordura para melhorar a oxidação de gordura através de dietas extremamente altas em gorduras e baixa em carboidratos mostrou redução na atividade do metabolismo de carboidratos e comprometeu a performance durante sessões de exercício de alta intensidade que são comuns na maioria dos esportes (Burke, 2015; Thomas et al., 2016).
Atletas vegetarianos e veganos podem garantir que a ingestão de gordura seja adequada em relação às diretrizes através da seleção criteriosa de fontes alimentares “plant-based” (Tabela 3) e laticínios com baixo ou alto teor de gordura, se desejado. Em geral, no entanto, a dieta vegetariana é rica em ácidos graxos poli-insaturados ômega-6, mas limitada em relação aos ácidos graxos ômega-3 (Li, 2003). Dietas lacto-ovo-vegetarianas também podem fornecer gorduras saturadas em excesso se a ingestão de gorduras animais incluindo queijos e outros laticínios com alto teor de gorduras e ovos forem consumidos regularmente. Porque os ácidos graxos ômega-3 podem ser importantes para a modulação inflamatória (Thomas et al., 2016), atletas vegetarianos podem se beneficiar da seleção intencional de alimentos ricos em ômega-3 (Tabela 3) no lugar ou como complemento de alguns óleos ricos em ômega-6 (milho, semente de algodão, girassol e cártamo). Mesmo que a transformação endógena do ácido alfa-linolênico (ALA) à ácido eicosapentaenóico (EPA) seja ineficiente e influenciada pelo estado de saúde, sexo, idade e composição da dieta (sua conversão é maior quando as concentrações de ômega-6 são baixas), evidências sugerem que as necessidades de ômega-3 podem ser atingidas com o ALA por si só (Melina et al., 2016). A síntese endógena de EPA e ácido docosa-hexaenóico (DHA) a partir do ALA parece ser suficiente para manter concentrações estáveis a longo-prazo em vegetarianos. Atletas vegetarianos podem também considerar suplementos de microalgas ricos em DHA (Geppert et al., 2005), que são bem absorvidos e aumentam as concentrações sanguíneas de DHA e EPA. Atletas que habitualmente obtêm mais de 10% da energia a partir de gorduras saturadas deveriam repor algumas porções de laticínios com alto teor de gordura e/ou ovos além das fontes “plant-based” (Melina et al., 2016).
Tabela 3. Fontes vegetarianas de nutrientes essenciais.
Tradução:
Proteínas | Componentes funcionais e estruturais do corpo; em atletas servem como gatilho e fonte para a síntese de proteína muscular. | Leite, iogurte, queijo cottage, queijo, ovos, feijão, ervilha, lentilha, edamame, tempê, tofu, produtos à base de soja (hambúrguer vegetariano, salsichas e outros análogos da carne), oleaginosas, sementes, pasta de oleaginosas (incluindo amendoim), cereais incluindo pães, arroz, quinua, aveia. |
Gorduras saudáveis | Fonte de energia; auxilia na absorção de vitaminas lipossolúveis.
|
Oleaginosas, sementes, pastas de oleaginosas, abacate, azeitonas, azeite, semente de linhaça, coco, cereais como granola e Muesli, óleos vegetais incluindo canola, semente de uva, avelã, gergelim, semente de abóbora. |
Ácidos graxos ômega-3 | Modulação do processo inflamatório. | Nozes, linhaça, chia, óleos de canola, nozes, linhaça e. |
Ferro | Componente da hemoglobina e mioglobina e como parte dos citocromos e enzimas nas vias de produção de energia. | Feijão, ervilha, lentilha, edamame, oleaginosas, sementes, a maioria das hortaliças, grãos integrais e fortificados incluindo pães, arroz, quinua, cereais matinais. Melhor absorção com o consumo de fontes de vitamina C: frutas cítricas, frutas vermelhas, melão, pimentão, tomate, brócolis, couve, batata. |
Zinco | Componente de muitas enzimas incluindo aquelas envolvidas no metabolismo energético, síntese de proteína e função imunológica. | Feijão, ervilha, lentilha, edamame, oleaginosas, sementes, a maioria das hortaliças, grãos integrais e fortificados incluindo pães, arroz, quinua, cereais matinais, queijos. |
Cálcio | Crescimento, condução nervosa, manutenção e reparo do tecido ósseo, regulação da contração muscular e coagulação sanguínea normal. | Excelente biodisponibilidade (> 50%): repolho chinês/Napa, chicória, acelga, couve, quiabo, folha de nabo, proteína vegetal texturizada, melaço. Biodisponibilidade média (~30%): leite, iogurte, queijo, tofu com cálcio, suco de laranja fortificado (com cálcio citrato malato).
Baixa biodisponibilidade: leite de soja fortificado, a maioria das oleaginosas, legumes com sementes, suco de laranja (fortificado com fosfato tricálcio /lactato de cálcio). |
Vitamina D | Absorção do cálcio, saúde óssea, função da musculatura esquelética, função imunológica, modulação inflamatória. | Peixes gordurosos, ovos de galinhas alimentadas com vitamina D ou expostas à luz solar, cereais matinais fortificados com vitamina D, margarina, “leites” vegetais e sucos de fruta fortificados. Exposição dos braços, costas e pernas, por duas a três semanas, à luz solar perto do meio-dia por 25-50% do tempo que levaria para atingir um leve bronzeado. |
Iodo | Funciona como parte do hormônio da tireoide, que é essencial para regular o metabolismo e taxa cardíaca. | Sal iodado, peixes, frutos do mar, algas marítimas, laticínios e algumas marcas comerciais de pães. O conteúdo de iodo da maioria dos alimentos é baixo e afetado pelo conteúdo de iodo do solo, irrigação e fertilização. |
Vitamina B12 | Importante para produção de energia. | Fermento nutricional Redstar™, leite de soja e “leites” vegetais, cereais matinais e análogos da carne fortificados com B12 (hambúrguer vegetariano, salsicha, etc.). |
Riboflavina | Coenzima para inúmeras reações oxidação-redução em diversas vias metabólicas e na produção de energia. | Leite e bebidas à base de leite, produtos à base de pães e cereais fortificados; pequenas quantidades na maioria dos alimentos de origem vegetal. |
Vitaminas e Minerais: Vitaminas e minerais são parte essencial da dieta de todos os atletas. Atletas vegetarianos podem precisar de atenção especial para um grupo de nutrientes que são encontrados em menor quantidade nos alimentos que fazem parte de uma dieta vegetariana ou são menos absorvidos a partir de fontes vegetais em comparação com as fontes animais. Estes nutrientes incluem o ferro, zinco, cálcio, vitamina D, iodo e algumas das vitaminas do complexo B (B12 e riboflavina). Outros nutrientes incluindo o potássio, magnésio, folato, vitaminas A, C, E e K normalmente estão presentes de maneira abundante em uma dieta vegetariana equilibrada (Melina et al., 2016).
Ferro: A ingestão de ferro pode ser uma preocupação para atletas vegetarianos, particularmente atletas do sexo feminino. O Ferro não-heme (ferro de origem vegetal) é melhor absorvido com alimentos que contêm ácido ascórbico (exemplo, frutas cítricas ou sucos cítricos, tomates e melão) e outros ácidos orgânicos e é inibido pelos fitatos dos vegetais, os polifenóis, taninos do chá, cacau e café, soja e proteínas dos laticínios, além de alimentos com altas concentrações de cálcio, zinco e outros minerais divalentes (Otten et al., 2006). Cozinhar com utensílios de ferro também aumenta o conteúdo de ferro, particularmente quando os alimentos são ligeiramente ácidos (por exemplo, o molho de tomate). Se o nível de ferro é uma preocupação, o nutricionista esportivo ou médico devem avaliar se a suplementação de ferro é necessária (Maughan et al., 2018). Suplementos de ferro de alta dosagem não devem ser consumidos a não ser que a deficiência de ferro esteja presente, já que pode interferir na absorção de outros minerais (Otten et al., 2006) e pode levar a um excesso de estoques de ferro em indivíduos em risco para hemocromatose.
Zinco: Como o ferro, o nível subótimo do zinco pode ser de alguma forma prevalente em certos atletas, incluindo atletas do sexo feminino e atletas seguindo dietas veganas e vegetarianas. Em vegetarianos, um nível de zinco mais baixo pode ser atribuído a seleção de alimentos pobres em zinco ou a biodisponibilidade reduzida do zinco de alimentos de origem vegetal em comparação com alimentos de origem animal (Melina et al., 2016). Vegetarianos que consomem uma dieta variada e bem equilibrada que contém muitos alimentos de origem vegetal ricos em zinco (Tabela 3) incluindo leguminosas e grãos integrais provavelmente irão atingir um nível adequado de zinco sem suplementação dietética (Hunt et al., 1998). De maneira similar ao ferro, ácidos orgânicos como os cítricos, ácido málico e lático podem melhorar a absorção de zinco em alguma extensão (Lonnerdal, 2000), enquanto técnicas de preparação de alimentos como imersão e germinação de feijões, grãos, castanhas e sementes, e a fermentação do pão podem reduzir a ligação do zinco com o ácido fítico melhorando a sua absorção (Melina et al., 2016; Otten et al., 2006).
Cálcio e Vitamina D: A ingestão de cálcio é uma preocupação para atletas veganos e vegetarianos que consomem o mínimo de laticínios. Apesar de ser possível aos vegetarianos, incluindo os veganos, atingir as recomendações para o cálcio, uma seleção criteriosa de fontes que são bem absorvidas do cálcio em conjunto com a possível utilização de alimentos fortificados com cálcio pode ajudar a garantir a adequação deste mineral (Mangels, 2014). Alimentos de origem vegetal que são ricos em cálcio com boa absorção estão listados na Tabela 3. A biodisponibilidade do cálcio na maioria destes alimentos de origem vegetal é tão boa, ou melhor que o leite de vaca, que tem uma absorção parcial de 32% (Weaver et al., 1999) (Tabela 3). Exceções incluem o espinafre, acelga, folha da beterraba e ruibarbo, que tem uma baixa biodisponibilidade (<5-8%) devido ao alto conteúdo de oxalato destes alimentos. A vitamina D, que auxilia a absorção de cálcio, pode também ser uma preocupação para alguns atletas devido à exposição solar limitada e/ou ingestão reduzida de alimentos contendo vitamina D. Enquanto os vegetarianos e veganos podem estar em risco aumentado devido à baixa ingestão dietética (Crowe et al., 2011), fatores como a pigmentação da pele, intensidade da exposição solar e suplementação dietética são indicadores mais importantes do nível de vitamina D do que a ingestão de fontes alimentares (Chan et al., 2009). As necessidades de vitamina D podem ser atingidas pela exposição de braços, pernas, abdômen e costas (como exemplo, shorts e um top esportivo) à luz do meio-dia por ~10-30 minutos diversas vezes na semana dependendo da pigmentação da pele (Hossein-Nezhad & Holick, 2013)(Tabela 3). A suplementação com 1.000-2.000 UI/dia pode ser benéfica, especialmente para atletas que moram em latitudes extremas (>35 graus norte ou sul de latitude), que treinam principalmente em ambientes internos, utilizam protetor solar em excesso ou tem gordura corporal excessiva, pele com pigmentação escura ou pele muito clara e fotossensibilidade. Os veganos podem ser aconselhados a procurar a vitamina D-3 derivada do líquen ao invés da lanolina e a vitamina D-2 produzida a partir da irradiação do ergosterol fermentado (Mangels, 2014). Pesquisas sugerem, no entanto, que a vitamina D-2 pode ser menos efetiva que a vitamina D-3 quando consumida em maiores doses (>4000 UI).
Iodo: O nível baixo de iodo é comum em muitos veganos e vegetarianos que não consomem sal de mesa (normalmente fortificado com iodo) ou algas-marinhas, ou que consomem alimentos de origem vegetal cultivados em solo com baixas concentrações de iodo (Krajcovicova-Kudlackova et al., 2003, Melina et al., 2016). Também existe alguma evidência de que o iodo seja perdido pelo suor, o que pode colocar os atletas que apresentam altas taxas de suor em risco adicional em relação ao nível ideal (Smyth & Duntas, 2005). O estado adequado de iodo pode ser garantido encorajando os atletas a utilizarem sal iodado para cozinhar e salgar os alimentos (1/2 colher de chá ou 3g fornecem quase a quantidade da RDA, ou 1180mg de sódio) concomitante a redução adequada da ingestão de alimentos processados (veja tabela 3 para fontes adicionais). O sal marítimo, sais gourmet, a maioria dos temperos salgados (tamari, shoyu) e a maioria dos alimentos processados contendo sal não são iodados.
Vitamina B12 e Riboflavina: Atletas que seguem dietas veganas ou próximas das veganas estão em risco para baixo nível de vitamina B12 (Pawlak et al., 2013), que é encontrada exclusivamente em produtos de origem animal (Melina et al., 2016). Atletas veganos deveriam consumir alimentos fortificados com B12 diariamente, ou ingerir suplementos contendo vitamina B12 ou um multivitamínico. Atletas vegetarianos também deveriam considerar utilizar um suplemento se a sua ingestão de laticínios e/ou ovos é limitada. A riboflavina pode ser uma questão para veganos e vegetarianos que limitam a ingestão de laticínios (Herrmann & Geisel, 2002) e possivelmente também fazem restrição energética. As melhores fontes destas vitaminas e minerais para veganos e vegetarianos estão listadas na Tabela 3.
OUTROS ASPECTOS NUTRICIONAIS DO VEGETARIANISMO RELEVANTES AOS ATLETAS
EVITAR A BAIXA DISPONIBILIDADE DE ENERGIA PARA ATLETAS VEGETARIANOS
Atletas pressionados a obter sucesso nos esportes, atingindo (ou mantendo) um peso corporal baixo de maneira impraticável pela restrição alimentar e/ou exercícios em excesso apresentam risco para os distúrbios de baixa disponibilidade de energia atualmente denominados de Deficiência de Energia Relativa no Esporte (RED-S) (Thomas et al., 2016). Há algumas evidências de que distúrbios endócrinos, baixa densidade óssea, alimentação desequilibrada e outros fatores físicos podem ser mais comuns entre atletas vegetarianos (Larson-Meyer, 2018). Especialistas concordam, no entanto, que a prevalência aparentemente mais alta entre os vegetarianos é devido ao vegetarianismo ser frequentemente tido como uma maneira socialmente aceita de restringir a ingestão de alimentos e poder mascarar um distúrbio alimentar (Barnard & Levin, 2009). Entre indivíduos não atletas, os vegetarianos parciais ao invés de vegetarianos verdadeiros apresentaram maior risco de padrões de alimentação desequilibrados (Timko et al., 2012). Uma maior prevalência de RED-S entre os vegetarianos pode também ser não intencional e devido à seleção de alimentos de origem vegetal com baixa densidade energética e alto teor de fibras paralelo à alta demanda de treinamentos (veja seção anterior sobre Energia). Isto pode resultar na circulação reduzida dos hormônios sexuais (incluindo estrogênio, progesterona e testosterona) devido à interrupção da função reprodutiva hipotalâmica normal causada pela disponibilidade energética reduzida. A literatura mais recente também observou que concentrações mais baixas do estrogênio circulante em vegetarianos em comparação com indivíduos não vegetarianos estava associada com a ingestão de grande quantidade de fibras e baixa quantidade de gorduras, além de maior quantidade de estrogênio nas fezes (Larson-Meyer, 2018). A testosterona circulante mais baixa em atletas do sexo masculino devido à ingestão alta de fibras e reduzida de energia também é possível. Concentrações mais baixas de testosterona, no entanto, não são geradas pelo consumo excessivo de alimentos à base de soja ou fitoestrógenos da soja (Hamilton-Reeves et al., 2010). O consumo de soja por atletas do sexo masculino não leva a feminilização destes atletas. Atletas vegetarianas com função menstrual anormal ou testosterona reduzida devem ser aconselhadas sobre como atingir a demanda energética em uma dieta vegetariana. Para atletas em treinamento intenso, uma dieta “plant-based” com quantidade excessiva de fibras pode resultar em ingestão energética insuficiente, possivelmente reduzindo a circulação entero-hepática dos hormônios sexuais esteróides. Atletas do sexo feminino apresentando amenorreia deveriam ser encorajadas a visitar seus médicos pessoais ou médico da equipe para uma avaliação minuciosa.
ATLETAS VEGETARIANOS JOVENS
As dietas vegetarianas são apropriadas para todos os estágios do ciclo de vida incluindo a infância e adolescência (Melina et al., 2016). O jovem atleta, no entanto, pode se deparar com desafios extras durante fases de crescimento combinados com treino excessivo e/ou participação em esportes. Os nutrientes que podem ter necessidade de atenção no planejamento de dietas veganas e vegetarianas nutricionalmente adequadas para jovens atletas, particularmente durante fases de crescimento, incluem o ferro, zinco, vitamina B12 e para alguns o cálcio e a vitamina D. Além disso, as necessidades de proteínas para crianças vegetarianas podem ser ligeiramente maiores que a RDA para atender diferenças na digestibilidade das proteínas e composição de aminoácidos (Melina et al., 2016). Apesar dos fatores dietéticos terem o poder de interferir na absorção de ferro e zinco, deficiências destes minerais não são comuns em crianças vegetarianas que vivem em países industrializados (Gibson et al., 2014).
APLICAÇÕES PRÁTICAS
Atletas vegetarianos são capazes de atingir suas necessidades de ingestão de energia e nutrientes com planejamento adequado (Melina et al., 2016). O atleta deve ser encorajado a consumir uma dieta que contenha uma variedade de alimentos de origem vegetal incluindo alimentos como grãos integrais e enriquecidos, frutas, hortaliças, alimentos de origem vegetal ricos em proteínas, e (se desejado) laticínios e ovos. Profissionais e treinadores devem procurar entender as razões do atleta em escolher ser vegetariano, serem sensíveis às necessidades individuais e educarem adequadamente os atletas vegetarianos sobre as fontes de ambos macro e micronutrientes mencionadas, que caibam em suas crenças e valores pessoais. Os profissionais precisam ter certeza de que o atleta não se diz vegetariano para mascarar algum distúrbio alimentar, já que isso é uma doença mental séria que pode prejudicar a saúde e a performance atlética. Por último, nunca deve ser dito aos atletas vegetarianos que eles devem consumir produtos de origem animal para obter uma nutrição adequada.
A seguir estão algumas dicas para os atletas em relação à sua nutrição:
- Atingir as necessidades de energia é fundamental na obtenção de uma nutrição adequada e performance ideal.
- Carboiratos são essenciais para garantir a adaptação adequada aos treinos e maximizar a performance durante exercícios prolongados e repetitivos de alta intensidade. Atletas deveriam consumir entre 3-10g/kg MC/dia (e até 12g de carboidratos/kg MC/dia para treinos extremos e prolongados). Fontes de carboidratos incluem alimentos como grãos, frutas, sucos, legumes ricos em amido, suplementos esportivos (bebidas de reposição de líquidos, gels, barras esportivas) e açúcar de adição.
- As necessidades de proteínas variam dependendo do tipo do exercício e intensidade. Excelentes fontes vegetarianas incluem alimentos derivados da soja, feijões, lentilhas, tofu, oleaginosas, sementes e a maioria dos grãos incluindo a quinua (Tabela 3). Leite, iogurte, coalhada, queijo cottage e ovos são fontes ricas de proteínas para vegetarianos.
- A gordura alimentar é essencial para a absorção de vitaminas lipossolúveis e ácidos graxos essenciais. Alimentos ricos em gorduras mono e poli-insaturadas, como as oleaginosas e sementes, abacate, azeitonas e azeite, óleo de gergelim, deveriam ser incluídos na dieta. Fontes vegetarianas de gordura ômega-3 que incluem as nozes, linhaça, chia, e óleos de canola, nozes, linhaça também deveriam ser parte da dieta. No entanto, a ingestão de gorduras saturadas e gorduras trans encontradas em laticínios com alto teor de gordura, coco e muitos alimentos processados deve ser limitada.
- A ênfase na inclusão de alimentos ricos em ferro, zinco, cálcio, vitamina B12 e riboflavina é essencial (Tabela 3). Enquanto o consumo destes nutrientes através de alimentos naturais e fortificados é preferencial, estes nutrientes podem ocasionalmente necessitar de suplementação (Melina et al., 2016; Thomas et al., 2016). A suplementação com vitamina D, em particular, pode ser necessária quando a exposição à luz solar é limitada. A suplementação com iodo pode ser necessária para aqueles que moram em áreas com baixos níveis de iodo nos alimentos ou quando não se utilizar sal iodado (Maughan et al., 2018). A suplementação geral deveria ser considerada para dietas restritivas ou com baixa densidade energética.
- As razões de um atleta para escolher ser vegetariano e as recomendações baseadas em alimentos com boa aceitação devem ser consideradas, ponderando também a filosofia implícita no contexto do atleta sobre vegetarianismo.
CONCLUSÕES
Atletas de todos os níveis de competição podem atingir suas necessidades de energia e nutrientes por meio de uma dieta vegana ou vegetariana que contenha uma variedade de alimentos, incluindo grãos, frutas, hortaliças, alimentos de origem vegetal ricos em proteínas, e (se desejado) laticínios e ovos. Dependendo da preferência alimentar, padrões alimentares e intensidade de exercícios, no entanto, a dieta de alguns atletas pode conter quantidades abaixo das ideais de certos nutrientes essenciais, incluindo o total de energia, proteínas, ácidos graxos ômega-3, cálcio, vitamina D, ferro, zinco, iodo, riboflavina e vitamina B12. Nestes casos, os atletas podem melhorar o nível de nutrientes normalmente com uma seleção cuidadosa de alimentos contendo os nutrientes em falta (Tabela 3) e com uma fonte de suplemento quando necessário. Apesar das pesquisas sugerirem enfaticamente que uma dieta “plant-based” pode oferecer muitos benefícios à saúde dos atletas e não atletas de maneira igual, há pouca evidência de que as dietas vegetarianas isoladamente sejam melhores que as dietas onívoras na melhora dos treinos e performance atlética.
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