PONTOS CHAVE:

  • Os fitoquímicos psicoativos extraídos das plantas são “metabólitos secundários” que possuem papéis “ecológicos” nestas plantas que os sintetizam. 
  • Os efeitos dos três grupos estruturais predominantes – compostos fenólicos (incluindo os polifenóis), terpenos e alcalóides – na função cerebral humana correspondem em geral, aos seus diferentes papéis ecológicos. 
  • Os polifenóis, principal componente benéfico das frutas, hortaliças e bebidas/alimentos derivados das plantas, agem na melhora das funções cardiovascular e cerebrovascular. Os efeitos cognitivos e no humor são menos claros.  
  • Terpenos voláteis, como os monoterpenos provenientes de um grande número de ervas culinárias, os diterpenos do Ginkgo biloba, e os triterpenos do ginseng e Bacopa, podem exercer efeitos benéficos na função cognitiva e estado de atenção, tornando-os relevantes no campo dos esportes. 
  • Entre os alcalóides tóxicos, apenas a nicotina e a cafeína possuem legalidade e mostram alguma eficácia em termos de aspectos relevantes na função cerebral. No entanto, sua utilização é normalmente confundida com o vício e abstinência. 

 

 

INTRODUÇÃO

Em parte, a performance esportiva ideal depende de diversos aspectos do funcionamento cognitivo. A função psicomotora e outros aspectos da atenção/concentração, memória operacional espacial e informacional e da função executiva (o amplo conjunto de processos cognitivos de ordem-superior que controlam todos os aspectos do comportamento) são todos componentes intrínsecos da performance esportiva, com a contribuição específica relativa de cada um, dependendo das demandas específicas dos diferentes esportes. De maneira similar, o alto estado de alerta e a baixa fadiga mental vão naturalmente ter um efeito de oscilação na função cognitiva, motivação e performance. Todos estes aspectos da função cognitiva e estado psicológico podem ser modulados pelo consumo de determinados compostos provenientes das plantas conhecidos como “fitoquímicos”. 

Estes fitoquímicos são tipicamente “metabólitos secundários” (por exemplo, eles não têm um papel no metabolismo primário) e preenchem papéis “ecológicos” para a planta que os sintetiza, aumentando sua habilidade de sobrevivência e permitindo que ela interaja com o seu ambiente. A maioria dos fitoquímicos está em um dos três grupos estruturais que podem ser diferenciados pelos seus papéis ecológicos. Os “fenólicos” estão presentes em todo o material das plantas, onde eles têm papel de protetores principalmente em face aos estressores ambientais. Eles fornecem cor, proteção antioxidante contra a radiação ultravioleta e proteção antimicrobiana, particularmente nas camadas externas das folhas, frutas etc. e gerenciam o relacionamento das plantas com micróbios simbióticos do solo. Os “terpenos” têm um duplo papel dependendo do tecido em que se encontram na planta e o modo de liberação: os terpenos simples e voláteis atuam como atrativos de polinizadores ou outros animais simbióticos em doses baixas e suspensas (no ar), e agem como obstáculo tóxico nas concentrações mais altas encontradas em alguns tecidos das plantas e nas superfícies das folhas. Os terpenos mais complexos têm maior tendência de agirem como obstáculo para os insetos herbívoros e animais invertebrados, o que ocorre pelas interações com os sistemas nervoso e hormonal destes animais. O último grupo estrutural, os “alcalóides”, tem papel quase que exclusivamente tóxico, provavelmente através das interações diretas com o sistema nervoso de herbívoros (Kennedy, 2014a).

Os diferentes papéis ecológicos destes fitoquímicos nas plantas têm um paralelo com seus efeitos em humanos; por isso, a breve revisão deste artigo da Sports Science Exchange sobre seus efeitos psicoativos está subdividida em conformidade. Já que não há muitos dados coletados sobre este assunto em um contexto esportivo, o material a seguir é baseado na mais vasta literatura sobre ensaios controlados em humanos (veja Kennedy, 2019 para uma revisão mais extensa). Seria difícil argumentar que a maioria dos achados deste grupo de pesquisas não foram aplicados exatamente a um contexto esportivo. 

FENÓLICOS

O grupo de fitoquímicos mais intensamente estudado, os “fenólicos”, podem incorporar um (fenólicos simples) ou mais (polifenóis) do anel hidrocarboneto aromático fenil em sua estrutura. Os polifenóis podem então ser subdivididos, com a maioria sendo classificada como subgrupo dos flavonóides (divididos por si só em flavononas, flavonas, flavonóis, isoflavonas e antocianinas). As simples unidades de moléculas de diversos destes subgrupos podem ligar-se conjuntamente em dímeros, oligômeros ou polímeros mais complexos (duas, diversas e muitas unidades, respectivamente), e então normalmente são “desmontados” em unidades menores pela microbiota intestinal no intestino grosso do indivíduo.  

Os compostos fenólicos são parte inevitável da dieta humana, e os componentes principais que promovem a saúde das frutas e hortaliças (ao lado dos micronutrientes e fibras). As maiores quantidades são consumidas na forma de bebidas como o vinho e o chá, frutas/sucos de fruta e hortaliças, e eles existem em níveis baixos em alimentos processados e altamente energéticos. Apesar de geralmente descritos como antioxidantes, seus efeitos nos consumidores são atribuídos à sua habilidade de interagir com as vias intracelulares de transdução de sinal que carregam informações dentro das células, normalmente para o núcleo. Exemplos incluem as informações sobre o estado de energia interno e externo da célula, atividades externas, estressores, inflamações e infecções. Os “fenólicos” fazem isso interagindo com os receptores (de membrana ou nucleares) ou dentro das complexas cascatas de sinalização com efeito dominó. O efeito concreto é a modulação de uma ampla gama de respostas celulares, que podem resultar, por exemplo, nas respostas antioxidantes endógenas, respostas vasodilatadoras e anti-inflamatórias do corpo. Em relação ao cérebro, os mesmos mecanismos podem incluir interações diretas com o receptor neurotransmissor, aumento dos fatores de crescimento que levam à plasticidade sináptica e a síntese da molécula vasodilatadora Óxido Nítrico (ON), levando a um aumento do fluxo sanguíneo cerebral local, que por sua vez promove a neurogênese/angiogênese. Outro mecanismo resultante subsequente que gera aumento da defesa é o papel dos fenólicos na modulação das comunidades microbiotas do intestino, com papel bidirecional nas funções cerebrais e cardiovasculares – papel que reflete o gerenciamento de populações microbiotas simbióticas e absorção de nutrientes no sistema radicular das plantas (Kennedy, 2014b).

Estudos epidemiológicos individuais e meta-análises mostram claramente que o consumo de polifenóis ou alimentos ricos em polifenóis está relacionado com a proteção em todos os aspectos da doença cardiovascular, da incidência de doenças cerebrovasculares e demência, e melhor função cognitiva e redução do declínio cognitivo na meia-idade e populações mais velhas (Kesse-Guyot et al., 2012; Tresserra-Rimbau et al., 2014). Os benefícios cardiovasculares também têm sido confirmados em grande parte dos ensaios de intervenção controlada, principalmente envolvendo polifenóis derivados do cacau, que demonstraram efeitos benéficos consistentes através de parâmetros metabólicos e cardiovasculares, incluindo o fluxo sanguíneo periférico (Lin et al., 2016). Estes efeitos são alcançados com doses entre 200-500mg de flavonóis em 2 horas do consumo da primeira dose. 

Há também evidências consistentes, colhidas de mais de doze estudos com imagens cerebrais, mostrando que doses únicas e o consumo crônico de polifenóis em doses similares à citada acima podem aumentar o fluxo sanguíneo cerebral (Bowtell et al., 2017; Kennedy et al., 2010). No entanto, enquanto estes estudos geralmente também medem a função cognitiva, há pouca evidência de algum benefício cognitivo concomitante.

Checando a literatura mais ampla, há alguma evidência de que doses únicas de polifenóis, provenientes por exemplo, do cacau e das frutas, melhoram a atenção e performance da memória operacional/espacial. No entanto, diversos estudos falharam em relatar qualquer benefício passível de interpretação. A melhor evidência vem dos estudos de consumo crônico, em particular, um par de estudos metodologicamente idênticos realizados em 90 participantes idosos saudáveis (Mastroiacovo et al., 2015) e 90 participantes que sofrem alguma debilidade cognitiva relacionada à idade (Desideri et al., 2012), respectivamente. Os participantes receberam bebidas contendo 520mg ou 990mg de flavonóis ou controle por 4 semanas. Em ambos os estudos, a bebida com maior quantidade de flavonóis estava associada com benefícios cardiovasculares e melhor performance em uma ou duas tarefas cognitivas que avaliavam a atenção e função executiva. No entanto, certa quantidade de estudos avaliando os efeitos a longo prazo dos flavonóides do cacau e polifenóis das frutas geraram efeitos muito sutis ou achados nulos.  

TERPENOS

Terpenos são compostos de unidades do isopreno, um composto orgânico e volátil com 5 carbonos. Monoterpenos e sesquiterpenos (2 e 3 unidades de isoprenos, respectivamente) também são voláteis, evaporando no ar, e são sintetizados por todas as plantas como o principal componente volátil dos vapores, como em um buquê de flores, que atraem os polinizadores e animais simbióticos. Um subgrupo de plantas utiliza estes compostos voláteis com funções de defesa, e assim eles são liberados em doses muito maiores aos herbívoros por meio de mecanismos como as tricomas glandulares em formato de bexiga e que favorecem os insetos que ficam na parte inferior das folhas. Frequentemente, os terpenos voláteis utilizados nestes duplos papéis são os mesmos químicos que os insetos produzem para o seu próprio propósito de comunicação através do “feromônio/alomônio”. Uma minoria deste grupo de plantas também evoluiu para a utilização específica de terpenos com maior peso molecular, como os diterpenos e triterpenos (4 e 6 unidades de isoprenos, respectivamente) em papéis ecológicos. Em ambos os casos, eles exibem propriedades inseticidas e redutoras de apetite, potencialmente através de interações diretas com o sistema nervoso dos herbívoros. Além disso, os triterpenos interrompem o ciclo de vida dos insetos e outros herbívoros devido à sua semelhança estrutural com os hormônios dos animais. Este grupo pode também interagir com micro-organismos patogênicos e simbióticos do solo pelos receptores com afinidade ao estrogênio de bactérias e fungos (Kennedy, 2014a).

Monoterpenos

A subfamília Nepetoideae da família Lamiaceae das plantas, que constitui a maior parte das ervas culinárias e muitos óleos essenciais (terpenos voláteis destilados), é uma fonte particularmente rica das plantas que utiliza os terpenos voláteis em duplos papéis ecológicos. Seus membros incluem as ervas psicoativas como o alecrim, capim-limão, sálvia e hortelã-pimenta. Este grupo normalmente sintetiza os monoterpenos e os  sesquiterpenos como o 1,8-cineole (eucaliptol), α-pineno (cânfora), geraniol, geranial, bornel, canfeno e ß-cariofileno. Os extratos desta família de plantas têm um mecanismo de ação em comum (mas variável) relevante para o cérebro, por exemplo, inibindo a acetilcolinesterase e ligando-se de maneira alostérica ao receptor de ácido gama-aminobutírico (GABA, parte de um complexo canal iônico dependente de ligantes), receptores nicotínicos e muscarínicos (Kennedy, 2014a). Membros deste grupo (exemplo, a “erva-cidreira verdadeira” [Melissa officinalis]) com propriedades ansiolíticas/sedativas, devido às propriedades GABAérgicas, provavelmente não têm efeitos benéficos na função cognitiva em um contexto esportivo.  

Sálvia (Salvia officinalis/lavandulaefolia). Os óleos essenciais puros e voláteis dos terpenos (25-50μl) têm propriedades consistentes de inibição da colinesterase e efeitos benéficos na função cognitiva e/ou humor. Em relação aos óleos essenciais, isto inclui melhora da memória operacional, função executiva e maior atenção (Kennedy & Wightman, 2011). No estudo controlado por placebo mais recente, o consumo de doses únicas de 50μl de óleo essencial de monoterpeno, rico em 1,8-cineole, levou à uma melhor performance em atividades de atenção e memória além de maior atenção e redução da fadiga mental nas 4 horas seguintes (Kennedy et al., 2011).

Alecrim (Rosmarinus officinalis). As propriedades psicoativas podem se relacionar com a ligação a um receptor colinérgico e propriedades inibitórias da colinesterase. A biodisponibilidade dos monoterpenos através da absorção pulmonar durante a aromaterapia foi confirmada em dois estudos em que os níveis plasmáticos da 1,8-cineole aumentaram junto com a exposição ao vapor do óleo essencial do alecrim, e se correlacionaram com mudanças decorrentes na performance em atividades de atenção, memória operacional, memória prospectiva e funções executivas (Moss, 2017). Também foi demonstrado que doses únicas e crônicas comparativamente baixas (500-750 mg) de extrato seco de folhas de alecrim melhoram as medidas subjetivas ou objetivas da performance da memória e melhor atenção ou humor, mas com evidências de que estes benefícios foram revertidos com doses maiores (Pengelly et al., 2012).

Hortelã-pimenta (Mentha piperita). Óleos essenciais da hortelã-pimenta, ou o mentol, têm propriedades inibitórias da colinesterase e propriedades interativas com receptores nicotínicos, 5-hidroxitriptamina (HT3), GABA, glicina e receptores opioides. Estudos piloto mostraram previamente que o chá de hortelã-pimenta e o óleo essencial da hortelã-pimenta pingado na língua, ambos em comparação com a água, podem melhorar o funcionamento da memória e atenção e a performance física após minutos do consumo. Em um único estudo controlado por placebo duplo-cego até o momento, jovens participantes receberam óleo essencial encapsulado de hortelã-pimenta (50μl/100μl) que havia sido selecionado baseado em sua habilidade in vitro de inibir a colinesterase e de se ligar com receptores nicotínicos e de GABA. O consumo de uma dose maior do óleo essencial resultou em uma melhor performance em uma atividade de atenção focada e melhorou a performance em uma série de atividades de subtração e menor fadiga mental nas primeiras 3 horas após a dose (Kennedy et al., 2018, ).

DITERPENOS

Ginkgo biloba. Enquanto há um grande número de plantas que sintetizam diterpenos psicoativos, a única deste grupo com evidências de benefícios psicológicos relevantes é a Ginkgo biloba. Extratos padronizados normalmente contém 6% de diterpenos ginkgolídeos e seus bilobalídeos derivados (cerca de 24% dos polifenóis). Meta-análises sugerem que os extratos de Ginkgo podem exercer efeitos cognitivos e comportamentais promissores em indivíduos que sofrem de demência. Em populações saudáveis, extratos ingeridos por diversas semanas aumentaram o fluxo sanguíneo cerebral e melhoraram a função cognitiva, incluindo em termos de performance em atividades de atenção após dose única e consumo a longo prazo (Kennedy & Wightman, 2011). Como exemplo, 12 semanas de suplementação com Ginkgo melhorou a atenção, memória e avaliação subjetiva da saúde física em 300 participantes (Grass-Kapanke et al., 2011).

TRITERPENOS

Muitas das interações ecológicas e efeitos psicológicos dos triterpenos em humanos podem ser atribuídos a sua similaridade estrutural aos hormônios triterpenos sintetizados endogenamente por humanos (exemplo, os hormônios sexuais e glicocorticóides), insetos, invertebrados e plantas. Muitos extratos herbais contendo triterpenos são tradicionalmente classificados como adaptógenos – um termo que denota que eles funcionam principalmente protegendo o organismo que o consome dos impactos negativos dos estresses físicos, biológicos, químicos e psicológicos modulando  o eixo hipotálamo-pituitária-adrenal (HPA). Neste sentido, uma parte destes triterpenos interagiram com múltiplos receptores hormonais esteróides de mamíferos, incluindo receptores onipresentes de estrógeno e glicocorticóides. Essas interações poderiam fundamentar as interações multifatoriais que eles têm com funções do sistema nervoso, incluindo o favorecimento da síntese de Óxido Nítrico (ON) e modulação de neurotransmissores (Kennedy, 2014a).

Ginseng (Panax ginseng). Os componentes ativos aqui são triterpenos ‘ginsenosídeos’. Enquanto as evidências dos efeitos ergogênicos são de alguma forma ambíguas, meta-análises mostram que o ginseng pode ser um tratamento efetivo para a doença isquêmica cardíaca e disfunção erétil. Em relação a funções cerebrais humanas, alguns ensaios controlados randomizados, crossover balanceado de dose única (extrato de 200-400mg) demonstraram melhoras consistentes na precisão em atividades de memória, na velocidade de performance em atividades de atenção e melhoraram a performance em atividades difíceis de memória operacional/função executiva. Benefícios cognitivos em termos de memória operacional e humor (calma) após 7 dias ou mais de suplementação também foram relatados (Kennedy & Wightman, 2011).

Bacopa (Bacopa monnieri). Os constituintes ativos aqui são os triterpenos bacosídeos/bacopasídeos, que podem interagir com os sistemas de neurotransmissores acetilcolina, GABA, receptores opioides e com o eixo HPA (Kennedy, 2014a). Em humanos, uma recente meta-análise dos dados de nove ensaios clínicos randomizados controlados em dosagem crônica (> 12 semanas), encontraram que a suplementação com ~300mg/dia de extrato de Bacopa melhorou a performance em atividades de atenção e a velocidade de processamento de informações (Kongkeaw et al., 2014).

Outros triterpenos: Uma meta-análise mostrou que o consumo crônico de extratos de Centella asiática (Gotu kola) contendo asiaticosídeos promoveram aumentos significativos na atenção subjetiva e na calma (Puttarak et al., 2017). Estudos únicos também demonstraram melhora relevante na função cognitiva após uma única dose (800 mg) de extrato de Avena sativa (aveia comum) e 2 meses de administração da Withania somnifera (ashwagandha) e Rhodiola rósea – todos os quais contêm triterpenos.

ALCALÓIDES

Os alcalóides são um grupo estruturalmente diversificado de compostos de baixo peso molecular que contém um ou mais átomos de nitrogênio, normalmente como parte de um grupo amina. Eles são sintetizados com papéis exclusivamente tóxicos, protetores contra insetos herbívoros e invertebrados por aproximadamente um quinto de todas as espécies de plantas. Interações em todos os aspectos com as neurotransmissões é uma das funções características. Por isso, o grupo inclui muitos medicamentos psicotrópicos e a maioria das drogas ilícitas conhecidas. Dada a sua toxicidade, legalidade e propriedades psicofarmacológicas, pouquíssimos alcalóides poderiam oferecer benefícios no contexto esportivo, com duas exceções. 

NICOTINA

A nicotina se une perfeitamente aos onipresentes receptores nicotínicos de acetilcolina (colinérgicos), com efeitos consequentes que acontecem por meio de diversos sistemas neurotransmissores. Seu uso regular irá resultar no vício e habituação/efeitos de abstinência pelos receptores nicotínicos e mudança na sensibilidade. Enquanto a nicotina exerce efeito cardiovascular potencialmente relevante na melhora da performance física em consumidores idílicos de nicotina, há pouca evidência persuasiva de real melhora na performance (Johnston et al., 2017). Dados relacionados com a função cerebral são melhores. Uma meta-análise com dados de 50 estudos demonstrou que, sem levar em consideração a abstinência, a nicotina leva à melhora consistente na performance cognitiva em várias esferas, incluindo tarefas motoras finas, velocidade de resposta em tarefas de atenção e de memória operacional e precisão na atenção em tarefas de memória de curto prazo (Heishman et al., 2010).

CAFEÍNA

O fitoquímico psicoativo mais comumente consumido, a cafeína, ao contrário de qualquer outra metilxantina presente, tem efeitos rápidos e consistentes no sistema nervoso central devido à ligação inibitória dos receptores de adenosina A1 e A2 (McLellan et al., 2016). A cafeína, particularmente na sua forma anidra, tem propriedades ergogênicas bem estabelecidas e tem sido mostrada na melhora da performance tanto em exercícios de resistência quanto de alta intensidade e exercícios intermitentes. Estes benefícios são atribuídos principalmente ao seus efeitos no sistema nervoso central com doses moderadas/altas (~3-6mg/kg ou 225-450mg para uma pessoa com75kg) (Goldstein et al., 2010). No entanto, doses menores de 32mg e acima demonstraram melhora da função cerebral, com efeitos-platô com 300mg. Os efeitos da cafeína nas funções psicológicas são geralmente limitados no aumento subjetivo da excitação/estado de alerta, e melhor performance nas tarefas psicomotoras e nas tarefas do tipo de atenção “simples”, atenção focada e de vigilância. A cafeína tem efeitos inconsistentes na memória operacional e função executiva e não tem efeito interpretável na função da memória (McLellan et al., 2016). Assim como a nicotina, o uso da cafeína num contexto esportivo é complicado pela habituação e abstinência em consumidores regulares.

Interações da cafeína. A cafeína consumida em outras formas naturalmente presentes, como o café, também é efetiva na melhora da performance durante exercícios de resistência (Higgins et al., 2016). As evidências também sugerem que a cafeína pode gostar de interações de dependência e sinergéticas quando consumida em conjunto com outros compostos bioativos. Por exemplo, os efeitos na função cerebral da cafeína são modulados diferenciadamente, ou vice-versa pelo consumo em conjunto com outros fitoquímicos (Haskell et al., 2013), e com outros componentes alimentares. Baixas doses de cafeína também foram mostradas no aumento da biodisponibilidade de uma “série de compostos fenólicos”. Um estudo recente em humanos demonstrou que quando a cafeína era consumida em conjunto com os flavonóides do cacau, os efeitos cardiovasculares e os metabólitos dos flavonóides no plasma eram maiores em comparação com os flavonóides do cacau consumidos sozinhos. A cafeína sozinha não gerou efeitos (Sansone et al., 2017).

O guaraná (Paullinia cupana): O guaraná é um bom exemplo de uma potencial interação cafeína/fitoquímico. Os efeitos cognitivos e no humor dos extratos são normalmente atribuídos ao seu teor de cafeína, apesar da presença de altos níveis de polifenóis e saponinas triterpenos. Pesquisas mostram que o extrato de guaraná (75mg) pode melhorar as tarefas de atenção, função executiva e memória operacional, e gera nas doses relacionadas (37,5; 75; 150 e 300mg de guaraná) aumento do estado de alerta, da satisfação e da performance em atividades de memória, com a dose mais efetiva contendo níveis de cafeína associados com uma xícara de café descafeinado (4,5-9mg) (Haskell et al., 2007). Um estudo recente também mostrou que o guaraná mais um multivitamínico/mineral melhorou atividades de atenção/função executiva mais que o seu conteúdo de cafeína sozinho (Pomportes et al., 2014).

APLICAÇÕES PRÁTICAS

  • Está claro que consumir mais polifenóis, ou pela dieta ou como suplementos (dose ideal 200-500mg), pode estar associado com diversos benefícios quase imediatos na função cardiovascular e no fluxo sanguíneo cerebral. Existe grande probabilidade de que estes fatores irão resultar em uma melhor função cerebral a longo prazo. No entanto, a evidência relacionada a melhoras na função cognitiva e estado psicológico após suplementação em curto prazo é, atualmente, de alguma forma ambígua.
  • Terpenos comestíveis não estão associados com qualquer efeito colateral negativo. Além da folha de sálvia, alecrim e hortelã-pimenta, e óleos essenciais (dose efetiva: sálvia 50μL, hortelã-pimenta 100+μL), é possível que outras ervas comestíveis ricas em monoterpenos tenham efeitos psicoativos benéficos. No entanto, aqueles com utilização tradicional como ansiolíticos ou sedativos, como o capim-limão, deveriam ser evitados. Para os triterpenos, tanto a dose única do extrato de ginseng (200-400mg) quanto a dosagem crônica (300+mg) de Bacopa tiveram efeitos benéficos estabelecidos, mas há pouca informação sobre a utilização inversa para ambos.
  • A utilização regular (por exemplo durante o treinamento) da nicotina e cafeína pode causar vício e potencial efeito de abstinência que provavelmente irão confundir qualquer efeito benéfico. Produtos que combinam doses baixas de cafeína com outros fitoquímicos (como o guaraná, extratos/chocolate ricos em flavonóis) podem exercer benefícios que são maiores do que aqueles associados com seus componentes isolados, mas permanece uma possibilidade inexplorada de que estes efeitos também aconteceriam em consumidores regulares da cafeína. 

RESUMO

Um número de fitoquímicos têm efeitos cognitivos e no estado de alerta/estimulação que podem ser relevantes na melhora da performance esportiva. De maneira geral, estes efeitos se relacionam com os papéis ecológicos do grupo dos fitoquímicos. Os fenólicos, que de longe atualmente atraem o maior número de atenção das pesquisas, são intrínsecos para a boa saúde e função cardiovascular/cerebrovascular como parte da dieta diária. No entanto, evidências de benefícios adicionais para a função cognitiva e humor após suplementação a curto prazo são atualmente fracas. Este perfil de efeitos funcionais está de acordo com seus papéis nas plantas como protetores em geral. Terpenos e alcalóides, que não são componentes naturais e imprescindíveis da dieta, têm papéis ecológicos que incluem interações com o sistema nervoso central de simbióticos e/ou herbívoros e portanto, podem ser esperados a exercer mais efeitos notáveis na função cerebral. Os terpenos tendem a ser esquecidos, mas as evidências de benefícios cognitivos e efeitos no humor são promissoras para diversas ervas comestíveis monoterpenos como a sálvia, o alecrim e a hortelã-pimenta; o Ginkgo biloba rico em diterpenos; e muitos outros extratos ricos em triterpenos, incluindo o ginseng e Bacopa.  Enquanto há falta de pesquisas relacionadas com alguns pontos de todos estes extratos, eles são todos seguros e bem tolerados e nenhum está associado com efeitos negativos significativos em qualquer parâmetro. Os alcalóides, como o componente arquétipo de defesa das plantas, frequentemente têm efeitos intensos na neurotransmissão tanto em consumidores herbívoros quanto humanos. Seu status de legalidade, potência e toxicidade significa que somente a nicotina e a cafeína atualmente têm qualquer papel potencial óbvio na melhora cognitiva no contexto esportivo. No entanto, a nicotina é viciante levando à habituação e efeitos de abstinência, e portanto, padrões de dosagens para ambos os compostos precisam ser considerados. Alguns dados interessantes têm surgido em relação aos potenciais efeitos aditivos e sinergias quando fitoquímicos e baixas doses de cafeína são consumidos em conjunto, e fitoquímicos ou extratos ricos em nutrientes contendo baixas doses de cafeína podem ser uma abordagem racional para melhorar a função cognitiva. 

REFERÊNCIAS

Bowtell, J.L., Z. Aboo-Bakkar, M.E. Conway, A.R. Adlam, and J. Fulford (2017). Enhanced task-related brain activation and resting perfusion in healthy older adults after chronic blueberry supplementation. Appl. Physiol. Nutr. Metab. 42:773-779.

Desideri, G., C. Kwik-Uribe, D. Grassi, S. Necozione, L. Ghiadoni, D. Mastroiacovo, A. Raffaele, L. Ferri, R. Bocale, and M.C. Lechiara (2012). Benefits in cognitive function, blood pressure, and insulin resistance through cocoa flavanol consumption in elderly subjects with mild cognitive impairment: the Cocoa, Cognition, and Aging (CoCoA) study. Hypertension 60:794- 801.

Goldstein, E.R., T. Ziegenfuss, D. Kalman, R. Kreider, B. Campbell, C. Wilborn, L. Taylor, D. Willoughby, J. Stout, and B.S. Graves (2010). International society of sports nutrition position stand: caffeine and performance. J. Int. Soc. Sports Nutr. 7:1-15.

Grass-Kapanke, B., A. Busmane, A. Lasmanis, R. Hoerr, and R. Kaschel (2011). Effects of Ginkgo biloba special extract EGB 761® in very mild cognitive impairment (vMCI). Neurosci. Med. 2:48-56.

Haskell, C.F., D.O. Kennedy, K.A. Wesnes, A.L. Milne, and A.B. Scholey (2007). A double-blind, placebo-controlled, multi-dose evaluation of the acute behavioural effects of guaraná in humans. J. Psychopharmacol. 21:65-70.

Haskell, C.F., F.L. Dodd, E.L. Wightman, and D.O. Kennedy (2013). Behavioural effects of compounds co-consumed in dietary forms of caffeinated plants. Nutr. Res. Rev. 26:49-70.

Heishman, S.J., B.A. Kleykamp, and E.G. Singleton (2010). Meta-analysis of the acute effects of nicotine and smoking on human performance. Psychopharmacol. 210:453-469.

Higgins, S., C.R. Straight, and R.D. Lewis (2016). The effects of preexercise caffeinated coffee ingestion on endurance performance: An evidence-based review. Int. J. Sport Nutr. Exerc. Met. 26:221-239.

Johnston, R., K. Doma, and M. Crowe (2017). Nicotine effects on exercise performance and physiological responses in nicotine‐naïve individuals: a systematic review. Clin. Physiol. Funct. Imag. 38:527-538.

Kennedy, D.O. (2014a). Plants and the Human Brain. Oxford University Press: New York.

Kennedy, D.O. (2014b). Polyphenols and the human brain: plant “secondary metabolite” ecologic roles and endogenous signaling functions drive benefits. Adv. Nutr. 5:515-533.

Kennedy, D.O. (2019). Phytochemicals for improving aspects of cognitive function and psychological state potentially relevant to sports performance. Sports Med. 49(Suppl 1):S39-S58.

Kennedy, D.O., and E.L. Wightman (2011). Herbal extracts and phytochemicals: plant secondary metabolites and the enhancement of human brain function. Adv. Nutr. 2:32-50.

Kennedy, D.O., E.L. Wightman, J.L. Reay, G. Lietz, E.J. Okello, A. Wilde, and C.F. Haskell (2010). Effects of resveratrol on cerebral blood flow variables and cognitive performance in humans: a double-blind, placebo-controlled, crossover investigation. Am. J. Clin. Nutr. 91:1590-1597.

Kennedy, D.O., F.L. Dodd, B.C. Robertson, E.J. Okello, J.L. Reay, A.B. Scholey, and C.F. Haskell (2011). Monoterpenoid extract of sage (Salvia lavandulaefolia) with cholinesterase inhibiting properties improves cognitive performance and mood in healthy adults. J. Psychopharmacol. 25:1088-1100.

Kennedy, D., E. Okello, P. Chazot, M.J. Howes, S. Ohiomokhare, P. Jackson, C. Haskell-Ramsay, J. Khan, J. Forster, and E. Wightman (20189). Volatile terpenes and brain function: investigation of the cognitive and mood effects of mentha × piperita L. essential oil with in vitro properties relevant to central nervous system function. Nutrients 10(8):E1029.

Kesse-Guyot, E., L. Fezeu, V.A. Andreeva, M. Touvier, A. Scalbert, S. Hercberg, and P. Galan (2012). Total and specific polyphenol intakes in midlife are associated with cognitive function measured 13 years later. J. Nutr. 142:76-83.

Kongkeaw, C., P. Dilokthornsakul, P. Thanarangsarit, N. Limpeanchob, and C.N. Scholfield, (2014). Meta-analysis of randomized controlled trials on cognitive effects of Bacopa monnieri extract. J. Ethnopharmacol. 151:528-535.

Lin, X., I. Zhang, A. Li, J.E. Manson, H.D. Sesso, L. Wang, and S. Liu (2016). Cocoa flavanol intake and biomarkers for cardiometabolic health: a systematic review and meta-analysis of randomized controlled trials. J. Nutr. 146:2325-2333.

Mastroiacovo, D., C. Kwik-Uribe, D. Grassi, S. Necozione, A. Raffaele, L. Pistacchio, R. Righetti, R. Bocale, M.C. Lechiara, C. Marini, C. Ferri, and G. Desideri (2015). Cocoa flavanol consumption improves cognitive function, blood pressure control, and metabolic profile in elderly subjects: the Cocoa, Cognition, and Aging (CoCoA) Study—a randomized controlled trial. Am. J. Clin. Nutr. 101:538-548.

McLellan, T.M., J.A. Caldwell, and H.R. Lieberman (2016). A review of caffeine’s effects on cognitive, physical and occupational performance. Neurosci. Biobehav. Rev. 71:294-312.

Moss, M. (2017). Half way to Scarborough fair? The cognitive and mood effects of rosemary and sage aromas. Phytothérapie 15:38-43.

Pengelly, A., J. Snow, S.Y. Mills, A. Scholey, K. Wesnes, and L.R. Butler (2012). Short-term study on the effects of rosemary on cognitive function in an elderly population. J. Medicin. Food 15:10-17.

Pomportes, L., K. Davranche, I. Brisswalter, A. Hays, and J. Brisswalter (2014). Heart rate variability and cognitive function following a multi-vitamin and mineral supplementation with added guarana (Paullinia cupana). Nutrients 7:196-208.

Puttarak, P., P. Dilokthornsakul, S. Saokaew, T. Dhippayom, C. Kongkaew, R. Sruamsiri, A. Chuthaputti, and N. Chaiyakunapruk (2017). Effects of Centella asiatica (L.) Urb. on cognitive function and mood related outcomes: A systematic review and meta-analysis. Sci. Rep. 7:10646.

Sansone, R., J.I. Ottaviani, A. Rodriguez-Mateos, Y. Heinen, D. Noske, J.P. Spencer, A. Crozier, M.W. Merx, M. Kelm, and H. Schroeter (2017). Methylxanthines enhance the effects of cocoa flavanols on cardiovascular function: randomized, double-masked controlled studies. Am. J. Clin. Nutr. 105:352-360.

Tresserra-Rimbau, A., E.B. Rimm, A. Medina-Remón, M.A. Martínez-González, R. de la Torre, D. Corella, J. Salas-Salvadó, E. Gómez-Gracia, J. Lapetra, and F. Arós (2014). Inverse association between habitual polyphenol intake and incidence of cardiovascular events in the PREDIMED study. Nutr. Metab.