INTRODUÇÃO 

Do final do século 19 em diante, os corpos cetônicos (CCs) foram associados com consequências negativas da diabetes descontrolada, devido à super produção destes compostos serem responsáveis, em grande parte, pelas manifestações clínicas da cetoacidose diabética, estado o qual apresenta risco à vida (VanItallie & Nufert, 2003). Por outro lado, o valor terapêutico de maiores concentrações circulantes de CCs em estados não-patológicos, atingidas por meio da hipercetonemia induzida pela dieta e/ou pela cetose nutricional aguda, é cada vez mais reconhecido (Poff et al., 2020; VanItallie & Nufert, 2003). Estes CCs, como o acetoacetato (AcAc), o β-hidroxibutirato (βHB) e a acetona, são compostos derivados de lipídios, orgânicos, solúveis em água e produzidos quase que exclusivamente no fígado, e cuja produção é maior, obviamente, durante estados fisiológicos caracterizados por baixa disponibilidade de carboidratos (CHO), como, por exemplo, a inanição, o jejum prolongado ou como resultado das dietas cetogênicas (Poff et al., 2020; Robinson & Williamson, 1980).

 

O AcAc e o βHB apresentam efeitos pleiotrópicos (conjunto de múltiplos efeitos controlados por um único gene) em diversos órgãos, incluindo o cérebro, o coração e a musculatura esquelética, como substratos alternativos para a provisão de energia (Robinson & Williamson, 1980), de tal forma que há um antigo interesse no desenvolvimento de formas próprias para o consumo dos CCs com propósitos terapêuticos (Hashim & VanItallie, 2014). Ainda assim, apenas recentemente (em torno de 2015) os suplementos de cetonas exógenas (SCE) surgiram e passaram a estar disponíveis comercialmente (Evans et al., 2022; Poff et al., 2020). Esta classe de suplementos é atualmente composta pelos sais de cetona, ésteres de cetona, e pelos compostos de cetona como o 1,3-butanodiol (BD) e os triglicérides de cadeia média (TCMs), todos os quais produzem em diferentes magnitudes e cursos temporais um aumento agudo temporário nas concentrações circulantes de CCs (Tabela 1). Este aumento foi denominado “cetose nutricional aguda” ou “cetose exógena intermitente”, quando as concentrações de βHB circulantes são ≥ 0,5 mM (milimolar) (Evans et al., 2022; Poff et al., 2020).

Estudos recentes identificaram outros efeitos pleiotrópicos dos CCs incluindo a modulação da inflamação, do estresse oxidativo, de processos catabólicos e da expressão genética (Puchalska & Crawford, 2021). Além disso, de particular relevância aos contextos esportivos, são as ações metabólicas já bem estabelecidas dos CCs na alteração do substrato de energia utilizado, reduzindo a utilização da glicose nos tecidos secundários, os efeitos antilipolíticos no tecido adiposo, e diminuindo a proteólise na musculatura esquelética (Evans et al., 2017; Robinson & Williamson, 1980). Com o uso, aparentemente disseminado, dos SCEs no ciclismo profissional (Cary, 2018; VeloNews, 2020) e com a projeção do mercado global para os SCEs em atingir aproximadamente US$650 milhões até 2027, com uma taxa de crescimento anual de cerca de 5,1% neste período (ResearchAndMarkets.com, 2021), há um interesse considerável nos SCEs e na sua aplicação nos contextos esportivos. O propósito deste artigo do Sports Science Exchange é, portanto, descrever os tipos de SCEs atualmente disponíveis, suas bases de mecanismos para os efeitos possivelmente benéficos (ergogênicos) e prejudiciais (ergolíticos), e resumir brevemente os achados, até o momento, relacionados aos efeitos destes suplementos na performance do exercício e os resultados referentes à recuperação com relevância aos atletas.   

TIPOS DE SUPLEMENTOS DE CETONAS EXÓGENAS E SEUS EFEITOS NAS CONCENTRAÇÕES CIRCULANTES DE CORPOS CETÔNICOS  

As concentrações circulantes de CCs são normalmente ≤ 0,1 mM em um estado alimentado e aproximadamente 0,2, a 0,3, mM após o jejum noturno. As concentrações circulantes podem alcançar cerca de 1,0 mM e 5,0 mM após 24 hrs e após uma semana de jejum, respectivamente, e cerca de 0,5 a 3,0 mM em uma dieta cetogênica. A ingestão de SCEs é realizada com o objetivo de elevar as concentrações de βHB circulantes, e este efeito pode ocorrer em questão de minutos da ingestão e ser mantido por diversas horas, dependendo do tipo e da dose do SCE consumido, e isso também sofre a influência de outros fatores como o estado de jejum/alimentado, e estar em repouso ou se exercitando, de modo que essas grandes variações existem de acordo com o nível de cetose produzida (Evans et al., 2022). Os vários tipos de SCEs disponíveis comercialmente atualmente e/ou que são empregados em seres humanos e seus efeitos nas concentrações dos CCs circulantes estão resumidos na tabela 1.

Tabela 1: Tipos de suplementos de cetonas exógenas e os efeitos nas concentrações circulantes de βHB após a ingestão aguda. Notas: 1não disponível comercialmente atualmente (Q3 2022).

Tipo de Suplemento Breve panorama Efeitos na concentração circulante de βHB
Ácidos Graxos de Cadeia Média (AGCMs) / Triglicérides de Cadeia Média (TCMs)  Os AGCMs são ácidos graxos contendo 6 a 12 carbonos, absorvidos através do sistema porta hepático para o fígado, onde eles são rapidamente metabolizados a CCs

Um efeito colateral conhecido do alto consumo de TCMs é o desconforto gastrointestinal, que pode ser amenizado por uma introdução lenta e progressiva, por um período de uma a duas semanas 

A ingestão de ~30g AGCMs/TCMs normalmente eleva as concentrações circulantes de β-hidroxibutirato (βHB) para ~0,5 a 1,0 mM por um tempo de ~45 a 90 minutos
1,3-butanodiol (BD) O BD é convertido a β-hidroxibutiraldeído, e oxidado em βHB no fígado através da ação das moléculas álcool- e aldeído- desidrogenase, respectivamente.

O BD pode aumentar a concentração circulante de βHB isoladamente, mas é também utilizado como um componente “éster” dos ésteres de cetona para aumentar ainda mais as concentrações circulantes de βHB 

A ingestão de ~35 a 50 g de BD normalmente eleva as concentrações circulantes de βHB para ~0,5 a 1,0 mM por ~30 a 90 minutos
Sais de Cetona (SC)  Os SCs são normalmente uma mistura racêmica de R,S-βHB (mas podem ser moléculas não-racêmicas de R-βHB) ligadas a um sal mineral, ou uma combinação de sais minerais, como cálcio, sódio, ou potássio  A ingestão de ~10 a 40 g de SCs racêmicos elevam as concentrações circulantes de R-βHB para ~0,4 a 1,0 mM por ~30 a 90 minutos, enquanto a concentração circulante de S-βHB tende a ser cerca de duas vezes mais alta e permanece elevada por diversas horas 
Ácidos Graxos de Cadeia Média ingeridos em conjunto com sais de cetona (AGCM+SC)  AGCM+SC é comumente a melhor combinação dos respectivos componentes em proporções 1:1 ou 2:1, o que permite menores dosagens dos componentes individuais e menor possibilidade de efeitos colaterais gastrointestinais  A ingestão de ~7 a 9 g de SCs racêmicos com ~7 g de AGCMs eleva a concentração circulante de βHB para ~0,6 mM por um período de ~60 min
(R)-3-hidroxibutil (R)-3-hidroxibutirato (R-BD R-βHB) monoéster de cetona (MEC) Um monoéster de cetona produzido pela síntese de R-BD e R-βHB A ingestão de R-BD R-βHB produz um rápido aumento “dose-resposta” na concentração circulante de βHB, por exemplo, ~1,5 mM, 20 minutos após a ingestão de 141 mg/kg e ~3,5 mM, 10 min após a ingestão de 573 mg/kg, atingindo concentrações de ~6,0 e ~6,5 mM, 40 e 70 minutos, respectivamente, após a ingestão de 573 mg/kg

Uma refeição realizada antes da suplementação atenua o aumento na concentração circulante de βHB em ~30%

R,S-1,3-butanodiol acetoacetato (R,S-BD AcAc) diéster de cetona (DEC)1 O diéster de cetona produzido pela transesterificação do t-butil AcAc com R,S-BD 

Não disponível comercialmente atualmente

A ingestão de 500 mg/kg (2 doses de 250 mg/kg, com 20 min de diferença) de R,S-BD AcAc elevou a concentração circulante de βHB para ~0,3 a 1,0 mM por um período de ~30 a 120 minutosA concentração circulante de AcAc foi elevada para ~0,4 mM
Bis-hexanol (R)-1,3-butanodiol (BH-BD) diéster de cetona (DEC)1 O diéster de cetona do ácido hexanóico (um AGCM cetogênico) e do R-1,3-butanodiol 

Não disponível comercialmente no momento 

A ingestão de 12,5 ou 25 g de BH-BD elevou a concentração circulante de βHB por um período de 3 h, com picos de ~0,8 mM em 30 min, e ~1,4 mM em 60 min, para a menor e maior dose, respectivamente 

O método mais direto de induzir a cetose de maneira exógena seria a ingestão de CCs isoladamente. No entanto, o βHB e o AcAc nas suas formas de ácidos livres podem ser instáveis, caros e ineficientes em produzir uma cetose contínua. Deste modo, os ácidos cetônicos podem ser tamponados com sódio, ou outros eletrólitos, para melhorar a sua eficácia e prevenir o excesso de algum mineral isoladamente. Há dois enantiômeros do βHB, chamados de R-βHB e S-βHB (também conhecidos por D- e L-, respectivamente). O R-βHB é a forma principal de βHB na circulação em condições fisiológicas, mas as concentrações de S-βHB podem ser elevadas com o consumo de SCEs incluindo os enantiômeros R-βHB e S-βHB, frequentemente o caso dos sais racêmicos de cetonas (como os sais R,S-βHB). Atualmente, os sais de cetona para consumo com maior disponibilidade comercial, são uma mistura racêmica dos enantiômeros R-βHB e S-βHB, principalmente porque a síntese das misturas racêmicas é mais barata, em comparação com os enantiômeros puros.

Os triglicérides e os ácidos graxos de cadeia média (TCM/AGCM) e o BD são precursores cetogênicos e, portanto, inclusos na ampla categoria de SCEs em virtude de seus efeitos no aumento das concentrações circulantes de βHB após uma ingestão aguda. TCMs/AGCMs ou o BD podem, cada um deles, ser ingeridos isoladamente ou utilizados em conjunto com CCs, normalmente na forma de AGCM + formulações de sais de cetona, ou no caso do BD, como base para a síntese de ésteres de cetona (Tabela 1).

Os ésteres de cetona são um termo utilizado para descrever as moléculas de R-βHB e AcAc ligadas a outro CC, ou a um precursor de CC, através de uma ligação éster, o que depois é separada pelos ésteres gástricos para liberar CCs na sua forma de ácido livre proveniente de uma molécula base, como R-BD ou R,S-BD. Ésteres de cetona utilizados na literatura das ciências do exercício incluem o R-3-hidroxibutil R-3-hidroxibutirato (R-BD R-βHB) monoéster de cetona (MEC) (Cox et al., 2016), originalmente desenvolvidos para melhorar a performance física e cognitiva em soldados na guerra (Ford &Glymour, 2014), e o R,S-1,3-butanodiol acetoacetato (R,S-BD AcAc) diéster de cetona (DEC) (Leckey et al., 2017). Uma adição importante para a categoria dos ésteres de cetona é o diéster do ácido hexanóico (um AGCM cetogênico) e do R-1,3-butanodiol (BH-BD) (Crabtree et al., 2022). Devido às inúmeras combinações possíveis de AcAc e βHB com precursores cetogênicos (incluindo BD, AGCMs, glicerol e aminoácidos cetogênicos), é provável que formas adicionais de SCEs sejam desenvolvidas no futuro.

Em doses toleráveis para humanos, a ingestão aguda de TCMs, BD, sais de cetona e R,S-BD AcAc DEC normalmente elevam as concentrações circulantes de βHB em aproximadamente 0,3 a 1,0 mM acima dos valores em repouso, enquanto a ingestão aguda de R-BD R-βHB MEC normalmente eleva as concentrações circulantes de βHB para valores entre cerca de 3 a 6 mM, e as concentrações durante o exercício para valores entre aproximadamente 1,5 a 4,0 mM (Evans et al., 2022). Ésteres de cetona, especialmente o R-BD R-βHB MEC, são, portanto, atualmente, o SCE mais potente disponível em termos de produzir, de maneira sólida e confiável, a cetose nutricional aguda (Tabela 1). Estas diferenças entre os tipos de SCEs e seus efeitos nas concentrações de βHB circulantes são relevantes porque provavelmente existem efeitos dependentes da concentração de βHB e de AcAc. Como resultado, o nível a ser excedido pela cetose nutricional aguda para que os efeitos no metabolismo da musculatura esquelética e na performance do exercício sejam observados foram propostos ser >1,0 mM (Evans et al., 2017; Shaw et al., 2020).

POR QUE HÁ UM INTERESSE EM SUPLEMENTOS DE CETONAS EXÓGENAS COMO AUXÍLIO ERGOGÊNICO? 

O principal papel fisiológico do aumento da cetogênese durante a baixa disponibilidade de CHO é que os CCs substituam a glicose como fonte primária de energia para o cérebro, e em menor grau, forneçam um substrato adicional para outros tecidos secundários, como o coração e a musculatura esquelética (Puchalska & Crawford, 2021; Robinson & Williamson, 1980). As consequências metabólicas da cetose nutricional aguda são tamanhas que há três mecanismos inter-relacionados de alguma maneira, por meio dos quais os SCEs poderiam agir, possivelmente, como auxílio ergogênico, tal como (i) a oxidação de CCs como um substrato alternativo na musculatura esquelética contrátil, (ii) melhor eficiência da produção de ATP quando CCs são utilizados como substrato durante o exercício, e (iii) um efeito dos CCs em desencadear uma menor dependência da utilização de CHO durante o exercício (Tabela 2). Com base nos dados coletados disponíveis, após a ingestão de R-BD R-βHB MEC, a oxidação dos CCs durante o exercício faz apenas uma pequena contribuição (~5%) para a provisão de ATP (Dearlove et al., 2021a; b), e enquanto há um relato de uma melhor eficiência delta durante atividade de ciclismo (Dearlove et al., 2021a), as evidências para a menor dependência da utilização de CHO não são claras (Cox et al., 2016; Poffé et al., 2020). Estes mecanismos, portanto, permanecem em grande parte inexplorados, e na ausência dos benefícios de performance como descrito abaixo, o potencial ergogênico da ingestão aguda de CCs exógenos é, atualmente, especulativa. Por outro lado, há também diversos mecanismos pelos quais os SCEs possivelmente poderiam apresentar efeitos ergolíticos na performance do exercício, e que também estão relacionados com padrões alterados da utilização de substratos, assim como considerações gastrointestinais (Tabela 2). 

Tabela 2: Visão geral dos possíveis mecanismos pelos quais a ingestão aguda de suplementos de cetonas exógenas (SCEs) poderiam resultar em efeitos ergogênicos ou ergolíticos na performance do exercício.

Possíveis mecanismos dos efeitos ergogênicos na performance do exercício 
Oxidação de corpos cetônicos (CCs) como substrato alternativo na musculatura esquelética durante o exercício  A descarga de CCs na musculatura esquelética é maior durante o exercício e contribui para a provisão de energia (estimada em ~2 a ~10%) 

As taxas de oxidação de β-hidroxibutirato (βHB) são ~0,1 a 0,3 g/min, após a ingestão aguda de R-BD R-βHB monoéster de cetona (MEC)

Melhor eficiência da produção do trifosfato de adenosina (ATP) quando os CCs são utilizados como substrato durante o exercício  Em comparação com a glicose e/ou com o piruvato, a energia livre disponível para realizar a atividade (energia livre de Gibbs para a hidrólise de ATP; ΔG’ATP) é maior com o βHB 

O βHB também produz um maior rendimento de energia por unidade de carbono, exemplo, expresso como kJ/C2 ou ATP/C2

Efeito dos CCs para desencadear menor dependência da utilização de carboidratos (CHO) durante o exercício  Devido à performance em muitos esportes de endurance ser dependente de CHOs e a performance ser limitada pelos estoques de glicogênio do fígado e/ou da musculatura esquelética, as estratégias que “poupam” a utilização de glicogênio podem ser ergogênicas 

A utilização de CHO reduzida e um aumento na utilização intramuscular de triglicérides foram observados após a ingestão de R-BD R-βHB MEC em um estudo (Cox et al., 2016), mas não em outro (Poffé et al., 2020

Possíveis mecanismos dos efeitos ergolíticos na performance do exercício 
A inibição da piruvato desidrogenase (PDH) e utilização prejudicada de carboidratos As estratégias nutricionais que reduzem a utilização de CHO por meio da inibição das enzimas metabólicas incluindo a fosfofrutoquinase e a PDH poderiam paradoxalmente também impactar negativamente a performance durante exercícios de alta intensidade como observado em estudos com dietas “low carb-high fat” e dietas cetogênicas
Consequências metabólicas da inibição da lipólise no tecido adiposo  A lipólise no tecido adiposo é um importante contribuinte para a provisão de energia durante o exercício, e essa inibição da lipólise pode prejudicar a performance em endurance, particularmente, atividades de longa duração

A ingestão aguda de R-BD R-βHB MEC ou de R,S-BD acetoacetato (AcAc) diéster de cetona (DEC) reduz as concentrações de ácidos graxos livres durante o exercício 

Distúrbios e sintomas gastrointestinais (GI)  Distúrbios GI podem impactar negativamente a performance por meio da distração, desconforto e/ou a redução da oferta de substrato proveniente da fonte exógena de energia 

Transtornos e sintomas GI (flatulência, diarreia, cólica, náusea e vômitos) foram relatados em alguns (mas não todos) estudos após a ingestão aguda de SCEs anteriormente ao exercício

Acidose moderada associada com a cetose nutricional aguda  A acidose moderada é às vezes associada com efeitos ergolíticos na performance do exercício 

A ingestão aguda de R-BD R-βHB MEC foi observada produzir uma acidose moderada (redução no pH de ~0,05 a ~0,10) durante o exercício (Dearlove et al., 2019; Poffé et al., 2021a; b)

OS EFEITOS DA INGESTÃO AGUDA DE SUPLEMENTOS DE CETONAS EXÓGENAS NA PERFORMANCE ESPORTIVA  

O primeiro artigo revisado por colegas sobre os efeitos da ingestão aguda de SCEs por humanos no metabolismo do exercício e na performance em endurance foi publicado em 2016 (Cox et al., 2016). A ingestão de 573 mg/kg de R-BD R-βHB MEC antes do exercício aumentou as concentrações circulantes de βHB para aproximadamente 2,0 a 2,5 mM durante o exercício e melhorou a distância máxima em um teste de tempo (TT) de ciclismo com duração de 30 minutos em aproximadamente 2% (411 ± 162 m; média ± EPM), quando realizado após uma pré-carga de 1 hora em 75% da força explosiva máxima (Cox et al., 2016). Desde este trabalho de referência, houve um aumento considerável no número de artigos investigando os efeitos no metabolismo e na performance do exercício da ingestão aguda em humanos, de diversos tipos de SCEs (revisado em Evans et al., 2022; Shaw et al., 2020; Valenzuela et al., 2021). As próximas sessões resumem brevemente estes achados. 

SAIS DE CETONA 

Estudos sobre os efeitos da ingestão aguda de sais de cetona na performance do exercício geralmente ofertaram aproximadamente 7 a 30 g de R,S-βHB e foram consistentes em produzir apenas aumentos modestos nas concentrações circulantes de βHB (geralmente cerca de 0,5 a 1,0 mM), com as estratégias de dosagem empregadas até o momento (Evans et al., 2022; Valenzuela et al., 2021). A performance do exercício nestes estudos não foi alterada expressivamente na condição “sais de cetonas” (Evans et al., 2022; Valenzuela et al., 2021). Contudo, um estudo observou uma performance prejudicada após a ingestão de 0,3 g/kg de sais de cetona (~25 g R,S-βHB), 50 minutos antes do exercício, como evidenciado por um TT de ciclismo de 150kJ (~10km) com média de força mais baixa, cerca de 7% (-16W) (O’Malley et al., 2017). Em contrapartida, um efeito ergogênico da ingestão aguda de sais de cetona na performance do exercício foi observado em dois estudos (Kackley et al., 2020; Quinones & Lemon, 2022), mas os resultados não são claros pelo fato de que a condição “sais de cetona” forneceu uma formulação pré-exercício multi-ingrediente contendo aproximadamente 100 a 120 mg de cafeína, cerca de 2,8 g de L-taurina e aproximadamente 2,1 g de L-leucina, além de cerca de 7,2 g de R,S-βHB. A performance após a ingestão de uma versão livre de cafeína desta formulação não diferiu da ingestão de um placebo isoenergético de CHO, o que sugere que a presença da cafeína provavelmente é uma influência forte para o efeito ergogênico daquela formulação pré-exercício (Quinones & Lemon, 2022). Em geral, há poucas evidências dos efeitos ergogênicos gerados pela ingestão aguda de sais de cetona comercialmente disponíveis atualmente, apesar da ressalva de que a maioria dos resultados de performance focaram em testes de performance em exercícios de curta duração e alta intensidade (Evans et al., 2022).

PRECURSORES CETOGÊNICOS: TRIGLICÉRIDES DE CADEIA MÉDIA (TCM) E O 1,3-BUTANODIOL (BD)

Os TCMs foram investigados inicialmente como meio para aumentar as concentrações circulantes de AGCMs ao invés das concentrações circulantes de CCs e, portanto, fornecer uma fonte de energia adicional durante o exercício quando as taxas de oxidação de glicose, ingerida oralmente, atingiram um máximo de cerca de 1,2 g/min. Contudo, os efeitos da ingestão de TCMs/AGCMs na performance do exercício não são claros (Clegg, 2010). O interesse mais recente em relação aos AGCMs seria como precursores cetogênicos em combinação com sais de cetona para desencadear maiores concentrações circulantes de βHB, em comparação com qualquer componente isoladamente.

Até o momento, dois estudos investigaram os efeitos metabólicos e de performance da ingestão simultânea de AGCMs e sais de cetona por humanos (Prins et al., 2020a; b). Ambos os estudos empregaram o mesmo desenho de ingestão, 60 min antes da realização de um TT de corrida em esteira por 5 km, com o suplemento AGCMs + sais de cetona contendo cerca de 7 a 9 g de R,S-βHB por porção consumido em uma única dose (Prins et al., 2020a; b), ou duas doses (Prins et al., 2020a). As concentrações circulantes de βHB aumentaram para aproximadamente 0,6 a 0,7 mM, 60 min após a ingestão, mas nenhum estudo observou um efeito no principal resultado do tempo para completar o TT de 5 km, quando comparado com um placebo de sabor similar, não-calórico. Até o momento, dois estudos investigaram o efeito da ingestão aguda pré-exercício de BD na performance de atividade de endurance subsequente (Scott et al., 2019; Shaw et al., 2019). O primeiro estudo empregou uma corrida submáxima de 60 minutos como pré-carga, seguida por um TT de corrida em esteira por 5 km (Scott et al., 2019), enquanto o segundo estudo empregou um TT de ciclismo de 7 kJ/kg (Shaw et al., 2019), e nenhum dos estudos observou efeitos ergogênicos da ingestão do BD. Em ambos os estudos, as concentrações circulantes de βHB atingiram uma média abaixo de 1 mM durante o período do exercício, tanto após a ingestão de 0,5 g/kg de BD (Scott et al., 2019) ou após ingestão de 2 doses de 0,35 g/kg de BD (Shaw et al., 2019). Portanto, sensações leves de euforia e tontura, e sintomas gastrointestinais leves (náusea e eructação), acompanhando este efeito modesto nas concentrações circulantes de βHB sugerem que o BD provavelmente não apresenta potencial ergogênico aos atletas. 

ÉSTERES DE CETONA 

Desde a observação inédita relacionada a uma melhora na performance em um TT de ciclismo de aproximadamente 2% após a ingestão de R-BD R-βHB MEC (Cox et al., 2016), muitos estudos examinando os efeitos da ingestão aguda de ésteres de cetona na performance do exercício foram relatados (Dearlove et al., 2019; Evans & Egan, 2018; Evans et al., 2019; Leckey et al., 2017; McCarthy et al., 2021; Peacock et al., 2022; Poffé et al., 2020; 2021a; b; c; Waldman et al., 2022) (Tabela 3). Apenas um destes estudos investigou a ingestão de R,S-BD AcAc DEC realizada em conjunto com uma estratégia de energia baseada em CHOs, e observou uma redução de 2 ± 1% (58,2 s) no tempo da performance em um TT de 31,2 km, e uma redução de 3,7% na força média em ciclistas profissionais (Leckey et al., 2017). As concentrações circulantes de βHB foram cerca de 0,4 mM e, portanto, visivelmente mais baixas do que a atingida com a ingestão de R-BD R-βHB MEC, e foram acompanhados por uma alta prevalência de sintomas gastrointestinais não presentes com o uso do CHO isoladamente (Leckey et al., 2017).

Os estudos restantes utilizando ésteres de cetona investigaram a ingestão aguda de R-BD R-βHB MEC. A maioria destes estudos observou efeitos insignificantes na performance do exercício (Tabela 3). No entanto, um estudo observou um efeito ergogênico em jogadores da associação de rugby profissional realizando um protocolo com simulação de uma partida de rugby, com características específicas às da associação (Peacock et al., 2022). Em comparação com o CHO isolado, a ingestão de 590 mg/kg de R-BD R-βHB MEC com CHO, antes e durante os exercícios, produziram concentrações circulantes de βHB > 2,0 mM e resultaram em uma melhora de 0,33 ± 0,41 s (2,1%) no tempo médio para completar um teste de performance mantendo uma alta intensidade e realizado regularmente durante o protocolo. Contudo, as performances nos tempos de sprints de 15 m e em atividade de empurrar trenós durante o protocolo não foram diferentes entre as condições (Peacock et al., 2022). Ao contrário, a performance em um TT de 30 minutos (precedidos por pré-carga de 60 minutos de exercícios de ciclismo com intensidade intermitente) foi prejudicada em cerca de 1,5% em ciclistas com bom condicionamento físico, após a ingestão de 50 g de R-BD R-βHB MEC em conjunto com uma estratégia de energia baseada em CHOs, que resultou em concentrações circulantes de βHB de aproximadamente 3,5 mM ao longo do TT (Poffé et al., 2021c).

As revisões recentes na área, de maneira não surpreendente, concluíram que no momento há uma falta de evidências para o efeito ergogênico dos ésteres de cetona (Evans et al., 2022; Valenzuela et al., 2021). Ainda assim, devido à variedade de fatores que podem influenciar a eficácia dos suplementos nutricionais nos contextos de performance, por exemplo, as especificidades dos testes de performance, o nível de treino dos participantes, o estado alimentado/jejum, e o acúmulo de nutrientes antes e durante a performance, e também específicos aos SCEs, como a concentração circulante de βHB atingida durante o exercício, permanece a possibilidade de que há contextos de performance específicos, onde a ingestão aguda de ésteres de cetona iriam fornecer um efeito ergogênico. 

Tabela 3: Resumo dos estudos com ingestão aguda de suplementos de cetonas exógenas na forma de ésteres de cetona na performance do exercício. 

Notas: 1 Estudo também inclui condições de bicarbonato de sódio isoladamente e bicarbonato de sódio em conjunto com MEC que não estão inclusos neste resumo. 

Abreviações: BD, 1-3-butanodiol; CAFF, cafeína; CHO, carboidrato; CP, peptídeos de colágeno; DEC, R,S-1,3-butanodiol acetoacetato (R,S-BD AcAc) diéster de cetona; MEC, (R)-3-hidroxibutil (R)-3-hidroxibutirato (R-BD R-βHB) monoéster de cetona; LT, limiar de lactato; PLA, condição placebo; TT, condição-tempo; VT, limiar ventilatório.

Autores Participantes Condições Testes de Performance e Resultados
Cox et al., 2016 6 atletas homens e 2 atletas mulheres de endurance  MEC+CHO vs. CHO Dose única bolus de MEC 60 min. de ciclismo (75% Força máx.), seguido por 30 min de TT de ciclismo (distância máx.) 

Pedalaram ~2% mais longe (média ± EPM 411 ± 162 m) com MEC+CHO comparado ao CHO 

Leckey et al., 2017 10 ciclistas homens, competindo internacionalmente  DEC+CHO+CAFF vs. CHO+CAFF

Duas doses bolus de DEC

4x 5 min. de ciclismo, como aquecimento padronizado, seguido por 31,17 km de TT de ciclismo 

Força média 3,7% mais baixa e performance foi 2 ± 1% (58,2 s) mais rápido, com DEC+CHO+CAFF comparado com CHO+CAFF

Evans & Egan, 2018 11 atletas homens, em esportes coletivos  MEC+CHO vs. CHO Três doses bolus de MEC 5x 15 min. de atividade intermitente (Teste de Corrida Intermitente “Vai e Vem” de Loughborough), seguida por 20 m de corrida “vai e vem” até a exaustão (alternando 55% e 95% da velocidade do VO2máx) 

Nenhuma diferença entre as condições em relação ao tempo da corrida “vai e vem” até exaustão 

Evans et al., 2019 7 corredores homens, 1 corredora mulher, meia e longa distância  MEC+CHO vs. CHO Três doses bolus de MEC 60 min. de corrida em esteira (65% VO2máx), seguida por um TT em esteira, por 10 km

Nenhuma diferença entre as condições em relação ao tempo para completar o TT

Dearlove et al., 2019 9 atletas homens, 3 atletas mulheres, saudáveis MEC vs. PLA calórico Dose única bolus de MEC Teste complementar de ciclismo até a exaustão 

Nenhuma diferença entre as condições em relação ao pico de força 

Poffé et al., 2020 12 ciclistas homens, treinados  MEC+CHO vs. CP+CHO 

Três doses bolus de MEC

180 min. de atividade de ciclismo (6x blocos de 30 min. em intensidades variadas), seguida por (A) um TT de ciclismo de 15 min., e (B) um ciclo até a exaustão em 175% LT W 

Nenhuma diferença entre as condições em relação à força média durante A, ou no tempo até exaustão durante B 

Poffé et al., 2021a1 9 ciclistas homens, treinados  MEC+CHO vs. CP+CHO 

Três bolus de MEC

180 min. de atividade de ciclismo (6x blocos de 30 min. em intensidades variadas), seguida por (A) um TT de ciclismo de 15 min., e (B) um ciclo até a exaustão em 175% LT W 

Nenhuma diferença entre as condições em relação à força média durante A, ou ao tempo até a exaustão durante B

Poffé et al., 2021b1 14 ciclistas homens, altamente treinados MEC+CHO vs. CP+CHO 

Três doses bolus de MEC

180 min. de atividade de ciclismo (6x blocos de 30 min. em intensidades variadas), seguida por (A) um TT de ciclismo de 15 min., e (B) um ciclo até a exaustão em 175% LT W 

Condições realizadas em altitude hipobárica com pico de 3000 m em 150 min. de exercício 

Nenhuma diferença entre as condições em relação à força média durante A, ou ao tempo até a exaustão durante B

Poffé et al., 2021c1 14 ciclistas homens, altamente treinados MEC+CHO vs. CP+CHO 

Duas doses bolus de MEC

60 min. de aquecimento padronizado seguido por (A) um TT de ciclismo de 30 min., e (B) um ciclo até a exaustão em 175% LT W 

Força média foi 3,8 ± 1,5 W (~1,5%) menor com MEC+CHO comparado ao CP+CHO durante A 

Nenhuma diferença entre as condições em relação ao tempo até a exaustão durante B

McCarthy et al., 2021 10 atletas homens e 9 atletas mulheres, saudáveis MEC+CHO vs. CHO Dose única bolus de MEC 5 min. de aquecimento, 30 min. em VT (71 ± 3% do pico de VO2), e 15 min. de descanso antes a um TT de ciclismo de 3 kJ/kg

Nenhuma diferença entre as condições em relação à força média, ou ao tempo para completar o TT

Waldman et al., 2022 14 bombeiros profissionais, homens   MEC vs. PLA não-calórico 

Dose única bolus de MEC

Exercício de treinamento para bombeiros em tempo real de busca e resgaste em incêndios (~11 min.; ambiente quente) 

Nenhuma diferença entre as condições em relação ao tempo para completar a atividade 

Peacock et al., 2022 9 jogadores homens de rugby, associação profissional de rugby  MEC+CHO vs. CHO Duas doses bolus de MEC 4x 21 min. de exercício intermitente (Teste “Vai e Vem” de Rugby da Universidade Bath), incorporando performance contínua de alta-intensidade, 15 m e sprints, e performance em uma atividade de empurrar um trenó durante o protocolo

Tempo médio para completar o teste de performance contínua de alta-intensidade melhorou 0,33 ± 0,41 s (2,1%) com MEC+CHO em comparação com CHO

Nenhuma diferença entre as condições em relação aos sprints de 15 m e na performance da atividade do trenó 

QUAL O FUTURO DOS SUPLEMENTOS DE CETONAS EXÓGENAS EM CONTEXTOS ESPORTIVOS?

É difícil conciliar a aparente popularidade dos SCEs no ciclismo profissional de elite (Cary, 2018; Velo News, 2020) com a falta de evidências para os efeitos ergogênicos na literatura publicada. Como os estudos em laboratórios com os suplementos nutricionais raramente estudam os atletas de elite em contextos reais de performance validados em campo, além dos estudos publicados atualmente não simularem fidedignamente a duração e o contexto do ciclismo profissional nos Grand Tours de três semanas, pode ser que os benefícios de performance que são óbvios para esses times e atletas não estão sendo capturados pelos estudos com SCEs em laboratórios até o momento. Estudos adicionais podem ser necessários para investigar se há estratégias com dosagem ideais, populações atléticas específicas, e/ou desafios específicos aos exercícios, para as quais a ingestão aguda de SCEs pode fornecer um benefício ergogênico. Outros possíveis caminhos de interesse incluem aumentar a recuperação após exercício agudo, e atenuar os efeitos prejudiciais da exposição aguda à hipóxia, da lesão cerebral traumática, e dos estados catabólicos. 

A RECUPERAÇÃO DO EXERCÍCIO AGUDO 

A ingestão aguda de SCEs foi investigada como método para complementar a melhor prática existente em relação às estratégias nutricionais com base em CHOs e proteínas, e para aumentar a ressíntese de glicogênio e a síntese de proteína muscular (SPM) durante a recuperação, mas os efeitos não estão claros. Um estudo investigou a ingestão de 573 mg/kg de R-BD R-βHB MEC em conjunto com um grampo hiperglicêmico (clamp) de 10 mM, por 2 h, realizado imediatamente após uma sessão de exercício com depleção de glicogênio, e relatou concentrações absolutas de glicogênio muscular sendo aproximadamente 50% maiores, em comparação com a condição controle (Holdsworth et al., 2017). Contudo, a diferença entre as condições, expressas como a mudança relativa na concentração de glicogênio muscular, em comparação com os respectivos valores pós-exercício, foi modesta. Outro estudo da ingestão de R-BD R-βHB MEC pós-exercício combinada com bebidas esportivas visando a recuperação, ingeridas de hora em hora, e fornecendo 1,0 g/kg/h CHO e 0,3 g/kg/h de whey protein hidrolisado, não observou efeito na ressíntese de glicogênio muscular durante as 5 h do período de recuperação, após 90 minutos de exercício de extensão de perna unilateral (Vandoorne et al., 2017). Um resultado secundário notável foi a observação, com a ingestão de R-BD R-βHB MEC, da maior fosforilação da S6K1 e 4E-BP1 durante a recuperação, que são dois reguladores essenciais da SPM por meio de mecanismos canônicos da via do alvo de rapamicina (mTOR).

EXPOSIÇÃO AGUDA À HIPÓXIA  

Estratégias alternativas de energia que atenuam os declínios da oxigenação sistêmica e na musculatura esquelética na performance do exercício e atenuam os sintomas do mal de altitude, podem fornecer benefícios ergogênicos durante exposição, moderada a alta, à altitude. A ingestão aguda de R-BD R-βHB MEC pode aumentar a oxigenação sistêmica e na musculatura esquelética em repouso e durante o exercício com exposição à hipóxia (Coleman et al., 2021; Poffé et al., 2021b), enquanto em repouso, o declínio na performance cognitiva durante exposição severa à hipóxia (simulando uma altitude de cerca de 5000m) foi atenuado pela cetose nutricional aguda (Coleman et al., 2021). A lesão cerebral traumática (LCT) pode ocorrer em contextos esportivos, com severidade variando de pequena, mas com traumas repetitivos subconcussivos, até traumas de alto-impacto evidentes, resultando em perda de consciência. A cetose atingida por dietas cetogênicas ou pela ingestão de SCEs, foi amplamente discutida para apresentar estratégias terapêuticas promissoras, profilática e/ou pós-lesão para LCT, através de um mecanismo pelo qual os CCs funcionam como substrato alternativo para a provisão de energia durante o período pós-lesão, quando o metabolismo de glicose está prejudicado. Neste caso, a glicose se torna o substrato de energia menos favorecido e a provisão de ATP é reduzida, e os CCs são um substrato alternativo que pode contribuir significativamente para o metabolismo cerebral (Daines, 2021; Stubbs et al., 2021). Recentemente, a gavagem oral diária após lesão com R-BD R-βHB MEC protegeu contra deficiências funcionais e morfológicas causadas pela LTC em ratos Sprague-Dawley, que sofreram impacto cortical controlado (Almeida-Suhett et al., 2022).

ESTADOS CATABÓLICOS 

Efeitos anticatabólicos dos CCs (Koutnik et al., 2019) em conjunto com potenciais efeitos anabólicos da cetose aguda nutricional, como por exemplo, um aumento de 10% na SPM durante infusão de sódio R,S-βHB por 6 h (Nair et al., 1988), sugerem que SCEs podem auxiliar a manutenção da massa muscular esquelética, em ambientes com alto nível de estresse (Stubbs et al., 2021). De relevância particular aos atletas, são os cenários onde eles estão em risco para quebra excessiva de proteína, recuperação inadequada e se exercitando excessivamente, como durante treinos intensos, fases de perda de peso intencional por meio da restrição de energia em esportes com categoria de peso ou períodos de inatividade forçada devido a lesões. 

Um estudo sugere que o consumo diário de R-BD R-βHB MEC (75 g/d, em 3 doses de 25 g) diminuiu os sintomas do excesso de exercícios durante três semanas de treinamento de ciclismo intenso em jovens do sexo masculino, fisicamente ativos (Poffé et al., 2019). Um fator de confusão neste estudo foi uma diferença importante entre os grupos que surgiu nos dados da ingestão alimentar, já que um aumento “espontâneo” de cerca de 20% na ingestão de energia foi observado no grupo “MEC” (Poffé et al., 2019). Enquanto diversas medidas de performance não mostraram diferenças entre as condições durante o estudo, a força durante um TT de ciclismo com duração de 30 minutos, realizado após pré-carga de 90 minutos, foi aproximadamente 15% maior com o uso de R-BD R-βHB MEC, em comparação com o controle, no 18º dia de treinamento (Poffé et al., 2019).

APLICAÇÕES PRÁTICAS 

  • Permanece a hipótese de trabalho de que existe limite (provavelmente > 1,0 mM) acima do qual as concentrações circulantes de βHB devem chegar para desencadear efeitos metabólicos agudos relevantes à performance do exercício. 
  • O alto custo e/ou a disponibilidade limitada dos ésteres de cetona atualmente, e as consequências negativas tanto dos efeitos parecidos com uma intoxicação do BD ou da alta carga mineral com os sais de cetona, são barreiras a serem superadas para que os SCEs sejam amplamente utilizados nos esportes.  
  • No momento, a maioria das evidências disponíveis não fornecem respaldo em relação à ingestão aguda de SCEs resultando em benefícios diretos de performance nos contextos esportivos. 
  • Ainda permanecem questões sobre fatores como se há estratégias com dosagens ideais (especialmente utilizando ésteres de cetona), relacionados a populações atléticas específicas e/ou aos desafios específicos do exercício, através dos quais a ingestão aguda de SCEs poderia fornecer um benefício ergogênico.

RESUMO

Há poucas dúvidas de que o AcAc e o R-βHB apresentam efeitos moleculares e metabólicos abrangentes, e os SCEs para consumo humano que estão disponíveis comercialmente levaram ao recente interesse sobre os CCs em contextos esportivos e terapêuticos. Apesar da base de mecanismos discutida para os possíveis efeitos benéficos dos SCEs, estes supostos mecanismos não foram amplamente explorados e permanecem, de certa forma, especulativos, enquanto as evidências atualmente são majoritariamente contra o uso de SCEs como auxílio ergogênico para a performance esportiva. Muitos pontos da regulação metabólica que influenciam a utilização dos substratos pela musculatura esquelética durante o exercício, possivelmente são alterados pela cetose nutricional aguda, e, portanto, mais investigações são necessárias para explorar a regulação da utilização de substratos durante o exercício após a ingestão de SCEs, e se os efeitos ergogênicos e ergolíticos destes suplementos são observados mais consistentemente. De maneira geral, os dados relacionados com a recuperação e o excesso de exercícios, à exposição aguda à hipóxia e à lesão traumática cerebral são preliminares, mas sugerem que há eficácia na utilização dos SCEs nestes contextos. 

Os pontos de vista expressos neste artigo são dos autores e não refletem necessariamente a posição ou políticas da PepsiCo, Inc.

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