PONTOS-CHAVE:

  • Em humanos, a sensação de sede tende a ser aliviada antes que a hidratação completa seja atingida.
  • Quando as taxas de suor são altas e a ingestão de líquidos ad libitum (à vontade) não é suficiente para repor as perdas de líquidos através do suor, o resultado é uma perda cumulativa de água corporal.
  • A perda de 2%, ou maior de massa corporal leva um certo tempo para acontecer. 
  • A desidratação > 2% da massa corporal está associada com a função termorreguladora prejudicada, esforço cardiovascular elevado, e em muitas condições com a performance prejudicada nos exercícios aeróbicos (por exemplo, exercícios mais intensos, mais longos e com maior elevação da temperatura corporal).
  • Circunstâncias em que a utilização da estratégia de ingestão de líquidos planejada é ideal, incluem: atividades com longa duração, > 90 minutos, particularmente no calor; exercícios de alta intensidade com taxas de suor elevadas; exercícios nos quais a performance é uma preocupação; e quando a meta almejada para a ingestão de carboidratos é de 1g/minuto.
  • Circunstâncias onde a utilização da estratégia de ingestão de líquidos em resposta à sede pode ser suficiente, incluem: exercícios com menor duração, < 60 minutos a 90 minutos; exercícios realizados em condições ambientais mais frias; exercícios de menor intensidade.
  • Recomenda-se NUNCA consumir uma grande quantidade de líquidos que resulte em ganho de peso.

 

INTRODUÇÃO

As duas linhas teóricas mais comuns, em relação à melhor prática de ingestão de líquidos durante o exercício, são a ingestão de líquidos programada versus a ingestão de líquidos em resposta à sede, ou ingestão ad libitum (à vontade). Ambas as estratégias procuram prevenir a hidratação excessiva ou insuficiente, e preservar a performance. No entanto, o sucesso de qualquer uma destas estratégias vai depender do contexto do evento (exemplo, duração, intensidade e características ambientais), das características do indivíduo (exemplo, forma física, climatização) e dos objetivos individuais em relação ao exercício, treino ou competição.

A ingestão de líquidos programada é definida como a utilização de um plano pré-estabelecido para a ingestão de líquidos. Esta estratégia se refere a ingestão de quantidades pré-determinadas de líquido com o propósito de minimizar as perdas. Como há uma variabilidade considerável entre indivíduos em relação às taxas de suor e concentrações de eletrólitos no suor, esta estratégia de ingestão recomenda um programa customizado de reposição de líquidos. Pela ingestão de quantidades próximas às perdas de suor, em ± 2% da massa corporal (para prevenir a desidratação ou a hidratação em excesso), o objetivo desta estratégia é impedir uma possível performance prejudicada no exercício, reduzir o esforço cardiovascular e o estresse na função termorreguladora associados à desidratação, reduzir o risco de doenças provocadas pelo calor (exaustão pelo calor, choque térmico) e prevenir a hiponatremia (Sawka et al., 2007). 

A determinação das taxas de suor pode ser realizada através de medidas antes e imediatamente após o exercício, para checar alterações na massa corporal (MC). Na ausência da ingestão de líquidos, essa alteração na massa corporal pode ser utilizada como o volume aproximado da perda de suor (exemplo, 1 kg = 1L), no entanto, podem existir pequenas fontes de erro nesta suposição.

A ingestão de líquidos em resposta à sede tem sido utilizada invariavelmente com a “ingestão ad libitum” (Hew-Butler et al., 2006). A “ingestão ad libitum” é definida como o consumo de líquidos sempre que desejado, na quantidade desejada (Ormerod et al., 2003; Vokes, 1987). O objetivo da estratégia de “ingestão em resposta à sede” é utilizar o mecanismo inato da sede para direcionar o consumo de líquidos, com o objetivo de prevenir o desenvolvimento da hiponatremia associada ao exercício e a desidratação excessiva (Hew-Butler et al., 2015).

 

O BALANÇO HÍDRICO E A SEDE

O equilíbrio efetivo de água corporal (perda de líquidos = obtenção de líquidos) é muito bem regulado no dia-a-dia, como resultado do mecanismo da sede e somado ao acesso irrestrito aos alimentos e bebidas (Institute of Medicine, 2005). No entanto, quando a perda de líquidos é maior que a ingestão, o resultado é a desidratação. Devido à água corporal ter uma flutuação diária normal, a desidratação é definida como o déficit de água corporal maior que a flutuação diária normal (Cheuvront & Kenefick, 2014), ou quando os déficits de água corporal excedem dois desvios-padrão da variabilidade da massa corporal normal ( 2% da MC) (Adolph & Dill, 1938; Cheuvront et al., 2004). Em repouso, este nível de desidratação ( 2% da MC) é o limite aproximado onde começam a ocorrer as ações compensatórias de regulação de líquidos (preservação de líquidos nos rins) e o estímulo para obtenção de líquidos (sede)(Reeves et al., 1998; Shirreffs et al., 2004). Estas ações compensatórias têm como gatilho a elevação na osmolaridade plasmática e em menor grau, a redução do volume do plasma (Cheuvront et al., 2013; Cheuvront & Kenefick, 2014). Durante o exercício, especialmente no calor, o volume plasmático diminui já que ele fornece o líquido para a produção do suor, e como resultado, a osmolaridade do plasma (“Posm”) aumenta, porque o suor é hipotônico (pobre em sódio) em comparação ao plasma. É importante lembrar que quando as perdas de água corporal ocorrem durante o exercício através do suor termorregulador, a perda total é dividida entre todos os compartimentos de líquidos. Um aumento na osmolaridade do plasma e extracelular, irá puxar líquido do espaço intracelular para que todos os compartimentos estejam em equilíbrio não-osmótico. Um aumento de ~2% na “Posm” (~6mmol/kg) é comumente referenciado como o limite osmótico para a preservação compensatória de água renal e obtenção de água (sede) equivalente à perda de ~2% da MC (1,4L em um indivíduo com 70 kg; Figura 1)(Cheuvront & Kenefick, 2014). A sensibilidade dos osmorreceptores na modulação e liberação do hormônio antidiurético e estimulação da sede é aumentada por perdas relativamente pequenas de volume. No entanto, a sede mediada pelo volume plasmático requer uma quantidade de perda muito maior (~10% do volume sanguíneo, ~1L), e as perdas de volume plasmático são apenas ~0,14L com a perda de ~2% da MC (Cheuvront et al., 2007).

Figura 1. A regulação do balanço hídrico do organismo em resposta ao déficit de água corporal típico do exercício/restrição de líquidos em um indivíduo com peso de 70 kg. O esquema inclui a magnitude estimada da desidratação (2% de perda de massa corporal) necessária para estimular a resposta dependente da osmolaridade para preservação compensatória e obtenção (sede) de água. TBW, total de água corporal; Posm, osmolaridade do plasma; AVP, arginina vasopressina.     

Uma alteração na TBW é associada com uma alteração na massa corporal (1L = 1 kg), pela qual a desidratação é então expressa como uma porcentagem de massa corporal de acordo com: (Δ massa corporal/massa corporal inicial)*100 ou para este exemplo, (1,4 kg/70 kg)*100 = 2%. 

 

Tradução da Figura:

2% da Massa Corporal

Déficit TBW // -1,4L

Limite // > 2% Δ Posm

Resposta // AVP // Sede

Compensação Fisiológica // Retenção Renal de Água// Obtenção de Água

 


Enquanto a sensação de sede funciona bem em repouso (Greenleaf & Sargent, 1965), ela é menos sensível durante o exercício. Os mecanismos que estimulam a sensação de sede estão sujeitos à diversas influências (Greenleaf & Morimoto, 1996), e a sensibilidade a estes sinais durante o exercício provavelmente é diferente devido ao estado fisiológico durante a prática de atividades físicas. Isto inclui a respiração e a taxa cardíaca elevada, fluxo sanguíneo renal e volume plasmático reduzido, e hormônio antidiurético e outros hormônios reguladores de líquido elevados. Observações sobre a não-sensibilidade do mecanismo de sede na manutenção total da água corporal durante o exercício têm sido relatadas por muitos anos. Dill et al. (1993) observou que quando um homem e um cachorro andaram por 32 km em uma condição ambiental quente com disponibilidade ad libitum de água, o cachorro manteve o equilíbrio do peso corporal enquanto o homem perdeu aproximadamente 3 kg. Conforme relatado, em períodos em que a taxa de suor foi alta (>1,0L/hora), seres-humanos com ingestão ad libitum tiveram ingestão de líquidos significativamente menor (Adolph, 1947; Adolph & Dill, 1938; Greenleaf & Sargent, 1965; Greenleaf et al., 1983). Greenleaf e Sargent (1965) relataram que quando em ingestão ad libitum, indivíduos consumiram aproximadamente metade do líquido perdido durante exercícios em condições ambientais frias e quentes. Mesmo com uma ingestão ad libitum, indivíduos que realizaram uma meia-maratona relataram sentir mais sede em comparação aos ensaios com ingestão de líquidos programada (Dion et al., 2013). Cheuvront et al. (2007) examinou as médias de um conjunto de 14 estudos sobre maratonas conduzidos em uma variedade de condições ambientais (10-28º C), e corredores com habilidades bastante diversificadas (2 horas, 10min a 4 horas; Figura 2), e concluíram que a ingestão ad libitum normalmente resultou em desidratação excessiva com 2% de perda da massa corporal. 

Figura 2. Nível de desidratação pós-corrida (eixo y; % de perda de massa corporal) vs. velocidade média da corrida e tempo de finalização para 42 km (eixo x), quando houve ingestão de líquidos ad libitum. Adaptado de Cheuvront et al. (2007).

 

Tradução da figura:

Desidratação ao Final da Atividade (% de Perda de Massa Corporal)

Velocidade média (m/min)

Tempo de Finalização (h: min)

 

E ainda, a sensação de sede é aliviada antes da reidratação completa ser atingida (Greenleaf, 1992), já que sinais orofaríngeos servem como gatilho para a satisfação da sede antes do volume total de líquidos ser totalmente restaurado (Bourque, 2008; Geelen et al., 1984; Rolls et al., 1980; Takamata et al., 1995; Thompson et al., 1987). Por exemplo, Greenleaf & Sargent (1965) também relataram que em ensaios experimentais posteriores com acesso ad libitum aos líquidos, indivíduos relataram sentir-se completamente recuperados e não apresentaram sede apesar de terem um déficit de líquidos de 4-5L. Por fim, é importante notar que a sensação de sede tem sido relatada a ser menos sensível durante o exercício em indivíduos idosos (Kenney & Chiu, 2001). 

DESIDRATAÇÃO: RESPOSTAS FISIOLÓGICAS E PERFORMANCE NO EXERCÍCIO

A maior parte da literatura sobre desidratação/performance no exercício sugere que durante o exercício, a desidratação aumenta o estresse fisiológico, medido pela elevação da temperatura interna corporal, taxa cardíaca e respostas em relação à percepção do esforço (Sawka & Coyle, 1999). E também, quanto maior o déficit de água corporal, maior o aumento no estresse fisiológico (Adolph, 1947; Montain & Coyle, 1992; Montain et al., 1995; Sawka et al., 1985). A desidratação também foi mostrada reduzindo a taxa de suor em uma determinada temperatura interna corporal, reduzindo a perda de calor evaporativa (Sawka et al., 1985) e elevando o estoque de calor (Fortney et al., 1984). Além disso, devido à redução no volume plasmático circulante como resultado da desidratação, a taxa cardíaca sofre elevação como efeito da redução no volume sistólico (Gonzalez-Alonso et al., 2000; Saltin, 1964). O estresse pelo calor combinado com a desidratação exacerbam estas respostas cardiovasculares como consequência, porque se cria uma competição entre a circulação central e a periférica, com um volume sanguíneo limitado (Rowell, 1986), posteriormente aumentando o estresse fisiológico em uma dada atividade física (Montain & Coyle, 1992; Montain et al., 1995).

Há um consenso na literatura de que a desidratação 2% da MC represente um limite onde a performance no exercício aeróbico ou de resistência se torna prejudicada (Cheuvront & Kenefick, 2014; Cheuvront et al., 2010; Sawka, 1992; Sawka & Noakes, 2007; Sawka et al., 2007). Em uma revisão avaliando 34 estudos sobre exercícios de resistência/desidratação, incluindo 60 observações separadamente (Figura 3), 41 das 60 observações (68%) foram significativamente prejudicadas pela desidratação 2% da MC (Cheuvront & Kenefick, 2014). Independente da significância estatística, o número de observações que reportaram redução na performance do exercício de resistência nos indivíduos com perda da MC 2%, foi 53 de 60 ou 80%. Mais revisões abrangentes são recomendadas para mais detalhes em relação ao impacto da desidratação nas respostas fisiológicas e performance no exercício (Cheuvront & Kenefick, 2014; Institute of Medicine, 2005; Mack & Nadel, 1996). 

Figura 3. Revisão dos efeitos da desidratação na performance em 34 estudos sobre exercícios de resistência/desidratação. As frações acima das barras representam o número de observações estatisticamente significativas (P<0,05) (numerador) do total de observações no nível especificado de desidratação. 41 das 60 observações no total (68%), foram significativamente prejudicadas (P<0,05) pela desidratação ≥ 2% da massa corporal. Adaptado de Cheuvront e Kenefick (2014).

 

Tradução da Figura:

Porcentagem de Observações com Performance Prejudicada

Nível de Desidratação

 

Uma crítica geral sobre os estudos com exercícios de resistência/desidratação revisados é que eles foram conduzidos em um laboratório onde as condições diferem das condições de ambientes externos. Críticas válidas desta literatura incluem obtenção da desidratação anterior ao exercício (ao invés de durante) e taxas de fluxo de ar irrealisticamente baixas. No entanto, uma revisão com estudos sobre desidratação, onde a perda de água ocorreu durante o exercício, relatou as mesmas conclusões (Cheuvront et al., 2003). Em um dos melhores exemplos de estudo em campo validado sobre esportes de resistência, Casa et al. (2010) examinou o impacto da desidratação (~2% de perda da MC) na performance em uma corrida de rua e relatou tempos ~5% mais lentos quando os indivíduos completaram a corrida desidratados.  

É importante notar que quando o exercício se inicia em um estado de boa hidratação, a perda de líquidos acumulada e o desenvolvimento consequente da sensação de sede pode levar tempo e será dependente de diversos fatores (como exemplo, ambiente, intensidade e duração do exercício, taxa de suor). Para reforçar este ponto, foram previstas perdas de suor para dois corredores hipotéticos com tamanhos corporais pequeno e grande, em distâncias de 5 km a 42 km (maratona) na temperatura de 22º C e condições de calor de 30º C (Kenefick & Cheuvront, 2012). Estas previsões ilustram diferenças nas necessidades de líquidos para diferentes intervalos de exercício, intensidades, ambientes e tamanhos corporais. As perdas de líquido foram expressas como a porcentagem da perda na massa corporal relacionadas com um limite de 2% de perda ao longo de cada evento (Figura 4 A, B). O que pode ser observado é que nos tempos finais típicos para a maioria dos corredores (ritmo moderado), as perdas de líquido são < 2% da MC para distâncias de até 21 km, e apenas quando a atingem a distância de maratonas em condições quentes (30º C) é quando os indivíduos maiores (80 kg) perdem > 2% da MC, nos momentos finais do evento (Figura 4). Para os corredores mais rápidos e competitivos (Figura 4B), as perdas de líquido são maiores em ambos tipos de corredores, tanto nos de tamanho menorquanto nos de tamanho maior , e excedem 2% da perda de massa corporal em ambas as condições ambientais (mais ou menos quentes), mas as perdas são abaixo de 2% da MC nas demais distâncias (5-21 km). Estes exemplos das estimativas de perdas são conservadores; no entanto, eles ilustram que a reposição de líquidos se torna cada vez mais crítica durante exercícios com maior intensidade e duração, particularmente em temperaturas mais quentes.    

 

 

Figura 4. Perda percentual de massa corporal prevista a partir da taxa de suor para corredores com 60 kg (barras claras), 80 kg (barras manchadas) com habilidade moderada (A) durante 5 km (25 min), 10 km (60 min), 21 km (130 min), e 42 km (270 min) e habilidade competitiva (B) durante 5 km (21 min), 10 km (43 min), 21 km (95 min), e 42 km (200 min) em corrida de rua. Linha pontilhada demarca 2% de perda de massa corporal. Assume-se para as perdas que não houve ingestão de líquidos. Adaptado de Kenefick e Cheuvront (2012).

 

Tradução da Figura:

A – Ritmo Moderado, 22º C // Ritmo Moderado, 30º C

% de Perda de Massa Corporal

B – Ritmo Acelerado, 22º C // Ritmo Acelerado, 30º C

% de Perda de Massa Corporal

Distância 

A INGESTÃO DE LÍQUIDO AD LIBITUM E A PERFORMANCE NO EXERCÍCIO

No geral, os achados da literatura sobre a ingestão ad libitum/em resposta à sede respaldam a ideia de que a manutenção do balanço hídrico em ± 2% da MC depende das condições ambientais, intensidade do exercício e duração do evento. Estudos sobre a ingestão ad libitum/em resposta à sede têm sido conduzidos em temperaturas ambientais baixas (Daries et al., 2000; Knechtel et al., 2010), durante eventos com duração de 2 horas ou menos (Berkulo et al., 2016; Daries et al., 2000; et al., 2013; Dugas et al., 2009) e quando eles são mais longos de duração (ultra-eventos) (Hoffman & Stuempfle, 2014; Hoffman et al., 2013; et al., 2010), eles tendem a ser exercícios com intensidades mais baixas. Muitos estudos sobre a ingestão ad libitum/em resposta à sede têm sido realizados em ambientes de campo ou durante competições (vs. em laboratório), onde há maior fluxo de ar, maior perda de calor por convecção e como resultado, menor estresse cardiovascular e da função termorreguladora. Também, na maioria dos estudos de campo ou em competições, voluntários começam o exercício em um estado normal de hidratação e progressivamente desidratam durante o evento ou ensaio. Assim, a perda da MC 2% pode não ser atingida até o final do evento, ou nem sequer ser atingida, no caso dos eventos/ensaios mais curtos. Além disso, há considerável dificuldade em realizar medidas precisas (por exemplo, massa corporal, ingestão de comida/líquidos, perdas de urina/fezes) em um ambiente de campo.

Estudos sobre ingestão de líquidos ad libitum ou em resposta à sede envolvendo corridas de resistência (Daries et al., 2000), eventos de meia-maratona (Dion et al., 2013), e maratonas (Beis et al., 2012), relataram maior estresse cardiovascular e da função termorreguladora (Dion et al., 2013), mas não expressaram diferenças no volume plasmático ou osmolaridade plasmática (Daries et al., 2000), e também não mostraram diferenças na performance da corrida (Beis et al., 2012; Daries et al., 2000; Dion et al., 2013). Estudos de ciclismo ad libitum relataram que as respostas cardiovasculares (Berkulo et al., 2016), termorreguladoras (Berkulo et al., 2016; Dugas et al., 2009), e a performance (Berkulo et al., 2016; Dugas et al., 2009) não são diferentes em comparação com a ingestão programada de líquido. Em contraste, Bardis et al. (2017) recentemente comparou a ingestão ad libitum à ingestão prescrita durante uma performance de ciclismo de 30 km no calor e concluiu que a ingestão de líquido similar às perdas de suor forneceu uma vantagem de performance devido ao menor estresse termorregulatório e maior resposta do suor. 

Estudos com ultramaratonas examinando a ingestão ad libitum concluíram que esta estratégia não levou à nenhuma incidência de hiponatremia (Knechtel et al., 2010), não impactou a performance apesar das perdas de massa corporal >3% (Hoffman & Stuempfle, 2014; Hoffman et al., 2013) e concluíram que a ingestão de líquidos em quantidade além da sede não é obrigatória para manter a hidratação durante eventos de ultramaratona. Em ocasiões em que os exercícios de ultra-resistência (atividades que consistem em muitas horas/muitos dias) estão envolvidos, como previamente mencionado, tais atividades com distâncias/durações específicas podem resultar em perdas significativas de massa não-líquida e perdas não provenientes do fluxo de água que fazem da determinação das alterações na massa corporal, perdas de líquido, ingestão de comidas e bebidas e perdas pela bexiga/intestinos, difíceis de serem estabelecidas e interpretadas.   

CONCLUSÕES

Fica claro que durante o exercício, uma estratégia de reposição de líquidos que mantenha o estado de hidratação em ± 2% da MC, seria bem sucedida na preservação da performance fisiológica e do exercício. Como demonstrado pelas nossas previsões sobre as necessidades de líquido, uma perda de líquido de 2% da MC pode levar tempo para ser acumulada e é dependente do tamanho corporal, condições do ambiente, intensidade do exercício e duração do evento. E ainda, parece que existem condições em que a ingestão de líquido ad libitum/em resposta à sede seria suficiente para atingir as necessidades, como exemplo, a manutenção do balanço hídrico em ± 2% da MC. Para indivíduos que têm menor preocupação com a performance ou que realizam atividades com intensidades menores, particularmente em climas mais frios, um plano de reposição de líquido pode não ser tão importante porque as perdas de líquido podem não atingir 2% da perda da MC. Estas condições incluem atividades e competições: com duração < 1 ou 2 horas, com exercícios de intensidades menores; e que acontecem em ambientes de temperatura fria. No entanto, também há condições em que uma ingestão de líquido programada é necessária para atingir as necessidades de líquido e uma estratégia customizada com ingestão de líquido programada terá a necessidade de ser implementada para evitar que a performance no exercício, função termorreguladora e cardiovascular possam ser prejudicadas (2% de perda da MC). Estas condições incluem atividades ou competições que: têm duração maior, > 90 minutos a 2 horas; têm maiores intensidades de exercício; acontecem em ambientes quentes; onde a ingestão de líquidos em uma taxa específica é almejada (exemplo, 1g de carboidrato/minuto). Ainda, uma estratégia de ingestão de líquido programada deveria ser customizada para prevenir perdas ou ganhos de ± 2% da MC (Sawka et al., 2007). É importante lembrar que a “performance” como já discutido nesta revisão tem sido relacionada com atividades de exercícios aeróbicos. O impacto da desidratação na performance em esportes coletivos é menos clara, já que estas atividades têm diversos componentes além do exercício aeróbico de resistência, incluindo a função motora e cognitiva (por exemplo, dribles, arremessos, passes, chutes, acertos), tomadas de decisão e força anaeróbica. E ainda, o impacto da desidratação provavelmente irá depender da contribuição relativa dos fatores que comprometem a realização de uma habilidade específica ou atividade, assim como os sistemas energéticos utilizados nesta atividade (Cheuvront & Kenefick, 2014).

Já que a prática da ingestão de líquido ad libitum/em resposta à sede parece substituir cerca de metade das perdas de líquido (Greenleaf & Sargent, 1965), esta estratégia poderia ser bem sucedida na prevenção da hiponatremia. No entanto, humanos consomem líquidos por razões que vão além da sede/reposição de líquidos e raros casos foram documentados onde indivíduos consumiram líquidos “de acordo com a sede”, mas ingeriram uma quantidade além da quantidade ideal e apresentaram hiponatremia (Hew-Butler et al., 2015). É também importante notar que a ingestão excessiva de líquidos normalmente ocorre quando há acesso abundante à água ou a outros líquidos hipotônicos, o que é comum em eventos de maior duração. É recomendado que ao consumir líquidos ad libitum/em resposta à sede ou na ingestão de líquidos de acordo com um programa pré-determinado, nunca se consuma uma quantidade excessiva de líquido que resulte em ganho de peso. 

APLICAÇÕES PRÁTICAS

  • A ingestão de líquido planejada deveria ser considerada em: atividades com maior duração, > 90 minutos, especialmente no calor; exercícios com maior intensidade; taxas maiores de suor; exercícios onde a performance é uma preocupação; e quando a ingestão de carboidratos de 1g/minuto é almejada.
  • A ingestão de líquidos em resposta à sede deveria ser considerada em: exercícios com menor duração, < 60 a 90 minutos; exercícios em condições ambientais mais frias; exercícios com intensidade mais baixa.
  • Indivíduos com altas taxas de suor ou aqueles que têm uma preocupação com a performance no exercício, deveriam determinar as taxas de suor em condições (intensidade do exercício, ritmo) e ambientes similares à quando estiverem competindo e customizar a ingestão de líquido para a prevenção de perdas de massa corporal > 2%.
  • Recomenda-se NUNCA consumir uma grande quantidade de líquidos que resulte em ganho de peso.

 

NOTAS

As opiniões ou afirmações aqui contidas são pontos de vista pessoais do autor e não devem ser interpretadas como oficiais ou refletindo os pontos de vista do Exército ou do Departamento de Defesa. O autor gostaria de agradecer a Karleigh Bradbury e Adam Luippold pela assistência administrativa e ao Dr. Dr. Samuel N. Cheuvront pela assistência editorial. Aprovada para publicação: distribuição ilimitada. 

 

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