PONTOS-CHAVE:

  • A calorimetria indireta é uma técnica não-invasiva comumente utilizada para estudar a contribuição da gordura no gasto energético durante o exercício.  
  • Foi desenvolvido um teste com exercícios progressivos que mede a taxa máxima de oxidação de gordura (MFO) e a intensidade do exercício em que a MFO ocorre (FATMAX).
  • Há uma grande variabilidade individual na MFO e FATMAX, com pesquisas recentes sugerindo que cada indivíduo possa ter uma curva de oxidação de gordura específica e única.
  • Evidências demonstram que a ingestão de carboidratos anteriormente ao exercício reduz a taxa de oxidação de gordura em ~30%.
  • Há hipóteses de que a ingestão de chá verde, groselha-negra da Nova Zelândia, cafeína e ácidos graxos ômega-3 aumenta a oxidação de gordura. Apenas o chá verde e a groselha da NZ se mostraram promissores, mas há a necessidade de mais pesquisas sobre os seus efeitos em condição de exercício e também sobre os mecanismos de ação envolvidos.
  • Estratégias para reduzir a disponibilidade de glicogênio nos músculos e/ou no fígado antecedendo os treinamentos podem aumentar a adaptação das vias que metabolizam a gordura e aumentar a oxidação de gordura durante o exercício.
  • No entanto, o aumento da oxidação de gordura durante o exercício não está associado com melhoras na performance.

 

INTRODUÇÃO

Durante o exercício, a oxidação das gorduras e dos carboidratos (CHOs) fornece energia para os músculos contráteis. A gordura é a fonte de energia predominante em exercícios de baixa intensidade e contribui com cerca de 50% da energia em exercícios com intensidade de ~50-60% da captação máxima de oxigênio (VO2max). À medida que a intensidade do exercício aumenta para além de ~60-65% do VO2max, existe uma mudança na utilização do substrato energético, com um aumento progressivo da contribuição relativa do CHO e uma redução concomitante da contribuição da gordura no gasto total de energia. A regulação da oxidação de gordura durante o exercício foi discutida em um artigo complementar do Sports Science Exchange (SSE) de autoria de Spriet e Randell (2020).

Um aumento no metabolismo de gordura durante o exercício pode reduzir a utilização de fontes esgotáveis de CHO, estocadas nos músculos e no fígado. Isto é frequentemente visto como um atrativo para atletas e/ou profissionais do esporte, já que se assume que preservar o glicogênio muscular e do fígado (reservas endógenas de CHO) poderia fazer com que ele fosse prontamente utilizado em períodos de exercício de alta intensidade (por exemplo, esportes “stop-and-go”), retardando a fadiga. Aumentar a dependência em relação à gordura durante os exercícios dos treinamentos pode também aumentar as adaptações que ocorrem nas vias que metabolizam a gordura na musculatura esquelética. O objetivo deste SSE é examinar como manipulações na dieta, suplementos nutricionais e estratégias de nutrição para os treinamentos podem afetar a oxidação de gordura durante o exercício, e na presença de dados disponíveis, comentar seus potenciais efeitos na performance do exercício. 

TAXA DE OXIDAÇÃO DE GORDURA EM ATLETAS

A calorimetria indireta é uma das técnicas mais utilizadas para estudar a contribuição da gordura no gasto de energia durante o exercício, por se tratar de um método não-invasivo. Além disso, esta técnica, apesar de ser indireta e necessitar de um estado estável para ser aplicada, permite a medição da oxidação de gordura durante um período de atividade física em ampla variação de intensidades de exercícios. Achten et al. (2002) desenvolveu e validou um protocolo de teste progressivo que estabeleceu a oxidação máxima de gordura (MFO; a maior taxa de oxidação de gordura), assim como a intensidade do exercício (mais comumente representada como a % do VO2max) em que esta determinada MFO ocorreu (FATMAX) (Figura 1). Primeiramente concebido para aplicação em bicicleta ergométrica, o teste envolve aumentos contínuos na taxa de atividade em 35W a cada 3 minutos, até a exaustão. Ao longo do teste são obtidas medidas “respiração a respiração” e calculadas as taxas de oxidação de gordura (utilizando equações estequiométricas) para cada etapa do teste (Jeukendrup & Wallis, 2005). Após este estudo inaugural um protocolo de teste em esteira também foi desenvolvido pelo mesmo grupo (Venables et al., 2005). 

Tradução da figura: 

Oxidação da gordura (g/min) // Intensidade do exercício (% do VO2max)

Figura 1. Exemplo de uma curva de oxidação de gordura (adaptado de Achten et al., 2002). MFO, taxa máxima de oxidação de gordura; FATMAX, percentual da captação máxima de oxigênio (VO2max) quando a taxa de oxidação de gordura é máxima.  

 

Desde então, inúmeros estudos têm utilizado este teste progressivo, tanto em esteira quanto em bicicleta ergométrica, para determinar as taxas de MFO em adultos que apresentam boa aptidão física (Achten et al., 2003), indivíduos sem experiência atlética (Stisen et al., 2006), além de indivíduos obesos e sedentários (Venables et al., 2005). Uma observação interessante que surgiu a partir destes dados foi uma grande quantidade de diferenças interindividuais existentes em ambas as medidas de MFO e FATMAX, em cada estudo e entre estudos que recrutaram participantes similares em termos de forma física, idade e composição corporal. Em um estudo de Randell et al. (2017), 1.121 atletas variando em idade, nível competitivo (recreacional – elite/profissional) e tipo de esporte, completaram um único teste progressivo em estado de jejum ( 5 horas). Em média, a taxa de MFO nesta população atlética foi 0,59± 0,18g/min. No entanto, este estudo também encontrou grande variabilidade individual na MFO entre todos os atletas (variação 0,17±1,27g/min) e também entre os esportes (Tabela 1). 

Para entender por que esta variabilidade existe, estudos investigaram as variáveis que podem estimar a MFO. Foi encontrado que a composição corporal, nível de condicionamento físico, sexo e dieta explicam ~50% desta variabilidade na MFO (Fletcher et al., Randell et al., 2017; Venables et al., 2005). Mais especificamente, em dois estudos de grande escala a massa livre de gordura (MLG) foi encontrada como sendo a única variável mais significativa em estimar a MFO, propondo que indivíduos com maior quantidade de MGL frequentemente exibem uma maior MFO (Rendell et al., 2017; Venables et al., 2005). No entanto, ainda há a necessidade em se determinar qual fator explica os 50% restantes da variância na MFO.

 

  Taxa Máxima de Oxidação de Gordura (g/min-1) FATMAX (% VO2max)
  Média Range Média Range
Futebol (N = 283) 0,58 0,17 – 1,11 51,8 22,9 – 88,8
Basquete (N = 164) 0,65 0,22 – 1,20 49,8 23,3 – 88,6
Tênis (N = 143) 0,51 0,25 – 0,88 47,5 25,4 – 84,4
Baseball (N = 125) 0,54 0,25 – 0,94 44,8 24,1 – 87,5
Futebol americano (N = 84) 0,65 0,27 – 1,27 43,7 23,3 – 79,2
Golfe (N = 60) 0,49 0,21 – 0,97 47,1 22,6 – 86,9
Hockey de campo/ Lacrosse (N = 60) 0,63 0,31 – 1,04 47,2 25,3 – 77,0
Rugby (N = 47) 0,72 0,38 – 1,09 53,5 24,6 – 79,2

Tabela 1. Taxas máximas de oxidação de gordura e FATMAX em diferentes esportes.  VO2max, captação máxima de oxigênio. FATMAX, percentual do VO2max em que a taxa de oxidação de gordura é máxima. 

 

Tabela 1.

Deve-se notar que nos estudos mencionados acima, apenas um teste com exercício progressivo foi realizado, focando em relatar as taxas de MFO e FATMAX. Observações não publicadas de um estudo de Randell et al. (2017) mostrou que cada indivíduo parece ter uma curva de oxidação de gordura única. No entanto, como apenas um único teste foi realizado, não se pode determinar se a curva seria similar, entre indivíduos, caso testados em diversas ocasiões. 

Recentemente, um estudo de Randell et al. (2019) mostrou curvas de oxidação de gordura de jogadores de futebol profissionais testados em duas ocasiões, com um intervalo de um ano. Curiosamente, foi observado que em 13 de 16 jogadores (80%) não foram encontradas diferenças na forma da curva da oxidação de gordura, quando os dois testes foram comparados. No entanto, em 6 de 16 jogadores houve uma diferença no deslocamento vertical da curva anual. Além disso, uma publicação recente encontrou grande variabilidade diária na MFO (coeficiente de variação (CV) de 21%) e na FATMAX (CV de 26%), em uma população heterogênea, quando testada em duas ocasiões (Chrzanowski-Smith et al., 2020). Estes dados sugerem que apesar dos indivíduos poderem ter uma forma única da curva da oxidação de gordura, a altura (exemplo, a capacidade de oxidar gordura) é mais suscetível de apresentar alterações e testes de repetição devem ser realizados para determinar mais precisamente a MFO e FATMAX numa base individual.

FATORES NUTRICIONAIS QUE AFETAM A OXIDAÇÃO DE GORDURA

Muitos fatores são atribuídos a um efeito direto ou indireto no aumento das taxas de oxidação de gordura durante o exercício. A regulação do metabolismo de gordura na musculatura esquelética durante o exercício e as adaptações que ocorrem com treinamentos regulares de resistência que aumentam a capacidade dos músculos esqueléticos em oxidar gordura e aumentam a MFO em todo o corpo, foram abordadas neste artigo do SSE (Spriet & Randell, 2020). Adicionalmente, e apesar de estar fora do escopo deste artigo, deve-se notar que existem diferenças entre os sexos na oxidação de gordura durante o exercício e que o leitor é convidado a ver a revisão recente sobre este assunto, realizada por Purdom et al. (2018), já que este tópico não será aqui abordado. 

Alimentação Pré-Exercício

Tem sido constantemente demonstrado que a ingestão de CHO pré-exercício resulta na oxidação reduzida de gordura durante o exercício subsequente. Isto acontece devido ao aumento resultante nas concentrações de insulina, que é conhecida por inibir a oxidação de gordura (Horowitz et al., 1997; Sidossis et al., 1996). Estes estudos também relataram o efeito da ingestão de CHO no metabolismo de substratos durante exercício prolongado (Horowitz et al., 1997; Sidossis et al., 1996).

Em termos da ingestão de CHO e os efeitos na FATMAX e MFO, Achten e Jeukendrup (2003) forneceram 75g de glicose, ou um controle placebo sem CHO, 45 minutos antes de um teste progressivo de performance em bicicleta ergométrica. No teste placebo a MFO foi de 0,46 ± 0,06g/min e a FATMAX ocorreu na intensidade de exercício de 60,1 ± 1,9% do VO2max. No entanto, no teste com CHO, a MFO foi reduzida em ~30% (0,33 ± 0,06g/min) e a FATMAX ocorreu em uma intensidade de exercício menor (52,0 ± 3,4% do VO2max). Deve ser destacado que o tipo e momento da oferta de CHO neste estudo não foi totalmente representativo de uma refeição pré-exercício comum de um atleta. E ainda, mais pesquisas são necessárias para investigar os efeitos de uma refeição rica em CHO, ingerida 3-4 horas antes de um teste progressivo, de MFO e FATMAX. 

Suplementos Nutricionais

Existe atualmente uma variedade de suplementos disponíveis comercialmente conhecidos como “fat burners” (termogênicos). Mais especificamente, alguns destes suplementos contêm ingredientes que estão associados com maior oxidação de gordura durante os exercícios (para uma revisão detalhada veja Jeukendrup & Randell, 2011).

 

Chá Verde 

Folhas de chá verde são não-oxidadas/não-fermentadas, e portanto, contêm alta quantidade de polifenóis catequinas, do qual o mais abundante é a epigalocatequina-3-galato (EGCG). O chá verde ou extrato de chá verde (ECV), devido ao grande conteúdo de polifenóis, tem sido estudado extensivamente pela sua potencial habilidade em aumentar a termogênese e metabolismo de gordura (Hodgson et al., 2013). Uma meta-análise conduzida por Hursel et al. (2011) relatou um aumento de 16% na oxidação de gordura em repouso quando um ECV (incluindo cafeína) havia sido consumido; no entanto, apenas seis estudos foram inclusos nesta análise. Durante o exercício, estudos que têm investigado os efeitos da suplementação com ECV nas taxas de oxidação de gordura relataram resultados ambíguos. Venables et al. (2008) encontrou um aumento de 17% nas taxas de oxidação de gordura em uma atividade de ciclismo constante por 30 minutos realizada em 60% do VO2max após dose aguda de ECV consumida antes do exercício, em comparação com o placebo. Para determinar se a oxidação de gordura foi continuamente maior com suplementação a longo prazo, Randell et al. (2013) comparou os efeitos da ingestão de ECV por 1 dia e por 7 dias em comparação com placebo. Apesar de haver um aumento nos níveis da EGCG plasmática (o suposto componente bioativo do chá verde), taxas médias de oxidação de gordura em atividade de ciclismo por 60 minutos em 50% da Wmax nos dois testes com chá verde não apresentaram diferenças em comparação com o teste placebo. Em um estudo de acompanhamento, a ingestão de ECV por 4 semanas também falhou em aumentar a taxa de oxidação de gordura durante exercício constante (30 minutos de pedalada em 50% da Wmax) (Randell et al., 2014).

Achados não publicados de Randell (2013) investigaram os efeitos da suplementação aguda com ECV na oxidação de gordura durante teste progressivo de exercícios. Novamente, não foram observadas diferenças estatisticamente significativas na MFO ou FATMAX entre o teste ECV versus teste placebo. No conjunto parece que a ingestão do chá verde pode aumentar a oxidação de gordura em repouso (apesar dos dados serem limitados). No entanto, os efeitos, se existiram, não são tão aparentes durante condições de exercício, e poderia ser concluído que o ECV não foi capaz de aumentar a oxidação de gordura além do estímulo do exercício por si só.

Groselha Negra

A groselha negra é outro ingrediente que ganhou a atenção da literatura científica por aumentar a oxidação de gordura durante o exercício. Foi demonstrado que a ingestão de groselha negra pode aumentar o fluxo sanguíneo periférico (Matsumoto et al., 2005), e portanto, a teoria sugere que a oferta de substratos de gordura aos músculos contráteis poderia ser maior para potencial oxidação neste caso. Como respaldo, Cook et al. (2015) encontrou um aumento significativo (27%) na oxidação de gordura durante exercícios de intensidade moderada (65% do VO2max), após suplementação com 300mg/dia de groselha negra da Nova Zelândia (NZBC), por um período de 7 dias em participantes do sexo masculino. Este aumento (27%) também foi encontrado em mulheres quando uma dose maior (600mg/dia) de NZBC foi consumida por um período de 7 dias (Strauss et al., 2018). Além disso, quando 15 homens com experiência em exercícios de resistência consumiram 0, 300, 600 ou 900mg/dia de NZBC por 7 dias, antes de um treino de ciclismo constante de 120 minutos, um aumento de 22% e 24% na oxidação de gordura foi encontrado apenas nos testes com maiores doses (600 e 900mg/dia, respectivamente) (Cook et al., 2017). Estudos mecanísticos nesta área são limitados, mas é especulado que o aumento do metabolismo de gordura após ingestão da groselha negra poderia ser multifacetado, incluindo o aumento no fluxo sanguíneo citado acima (Matsumoto et al., 2005) e o aumento da atividade das vias metabólicas (para revisão detalhada veja Cook & Willems, 2019). Deve-se notar que até o momento, o mecanismo proposto não foi investigado em condições de exercício.

 

Cafeína e Ácidos Graxos Ômega

É também sensato mencionar que pesquisas examinaram se a ingestão da cafeína e ácidos graxos ômega-3 (AGs) podem ter o potencial de aumentar a oxidação de gordura durante o exercício. Verificou-se que a ingestão da cafeína em doses moderadas a altas (~5-9mg/kg/massa corporal (MC)) pode aumentar as concentrações de ácidos graxos livres (AGLs) e glicerol, mas muitos estudos não relataram aumentos concomitantes nas taxas de oxidação de gordura (Graham et al., 200; Spriet, 2014). Qualquer aumento no metabolismo de gordura ocorreria apenas nos minutos iniciais do exercício, já que os AGLs do plasma são rapidamente reduzidos no início do exercício. Adicionalmente, com as doses mais baixas da cafeína (~3mg/kg/MC) mais comumente utilizadas nas pesquisas atuais, não foram relatados aumentos nos AGLs ou na oxidação de gordura (Spriet, 2014). 

Também foi demonstrado que os AGs ômega-3 ingeridos incorporam fosfolipídios da membrana para a musculatura esquelética (Gerling et al., 2019) e podem influenciar a permeabilidade e fluidez da membrana, e posteriormente alterar os processos metabólicos deste tecido (Jeromson et al., 2015). Um estudo de Logan e Spriet (2015) relatou um aumento nas taxas metabólicas de repouso (14%), oxidação de gordura em repouso (19%), gasto energético no exercício (10%) e oxidação de gordura no exercício (27%), após suplementação com ácido graxo ômega-3 durante 12 semanas em mulheres mais velhas e muito inativas. No entanto, quando o mesmo protocolo de suplementação foi administrado em indivíduos do sexo masculino jovens e saudáveis e em um grupo misto de homens e mulheres ativos, nenhuma alteração nas taxas metabólicas de repouso ou metabolismo dos substratos foi observada (Jannas-Vela et al., 2017; 2020). Até o momento, a literatura que examina os efeitos da suplementação com ácidos graxos ômega-3 no metabolismo de gordura é limitada, especialmente durante o exercício, e há a necessidade de pesquisas futuras. 

 

ESTRATÉGIAS NUTRICIONAIS PARA OS TREINAMENTOS

Submeter-se a treinamentos de resistência com baixa disponibilidade de glicogênio na musculatura e/ou no fígado, em geral, aumenta a expressão de genes envolvidos no metabolismo de gordura na musculatura esquelética humana (Impey et al., 2018). Estratégias utilizadas para reduzir o conteúdo de glicogênio muscular e/ou hepático incluem treinos duas vezes ao dia, pouco sono e/ou consumir uma dieta rica em gordura, e serão brevemente discutidas aqui (veja também Burke & Hawley, 2018; Impey et al., 2018 para revisões detalhadas). 

Treino Duas Vezes ao Dia

Este método de manipular a disponibilidade de energia envolve treinos duas vezes ao dia nos quais a segunda sessão de treino é realizada com baixa disponibilidade de glicogênio muscular (reduzindo a ingestão de CHO após a primeira sessão). Foi demonstrado que treinamentos com baixos níveis de glicogênio muscular, por apenas 3 semanas, aumentam a expressão de enzimas do metabolismo de gordura junto com um aumento concomitante na oxidação de gordura em ~25% em ciclistas bem treinados (Hulston et al., 2010). No entanto, deve ser destacado que este método de treinamento (duas vezes ao dia), frequentemente reduz a intensidade do exercício na qual a segunda sessão de exercício pode ser realizada. E ainda, este tipo de regime de treinamento deveria apenas ser implementado em momentos específicos da temporada quando a adaptação ao treino é o objetivo principal (e não a performance). 

 

Treino Intenso, Redução do Sono 

A abordagem pressuposta do “treino intenso, redução do sono” envolve a manipulação da ingestão de CHO próxima da sessão de exercícios. Em um estudo de Lane et al. (2015) participantes consumiram uma refeição com CHO (8g/kg/MC) antes de uma sessão noturna de exercícios de alta intensidade e depois dormiram sem comer (EM JEJUM), ou consumiram uma refeição com 4g/kg/MC de CHO antes e após a sessão de exercícios (ALIMENTADOS). Adicionalmente, uma sessão de ciclismo de ritmo constante foi realizada na manhã seguinte. A razão por trás desta estratégia é que uma restrição aguda de CHO na condição JEJUM prolonga a duração da baixa disponibilidade de CHO, e como consequência, o período de tempo da expressão gênica metabólica (assim como suas proteínas-alvo) será estendido e possivelmente maior. De acordo com esta hipótese, a expressão de genes do metabolismo de gordura e a síntese de proteínas do metabolismo de gordura, foram elevadas na condição JEJUM em comparação com o estado ALIMENTADO, e isto foi acompanhado de um aumento de 21% na oxidação celular durante uma sessão de exercícios de ritmo constante. No entanto, os trabalhos seguintes nesta área produziram resultados ambíguos, como Marquet et al. (2016a) que não encontrou alterações na utilização de substratos após uma intervenção de uma semana de redução do sono. E ainda, nenhuma diferença na oxidação de gordura foi observada durante exercício submáximo quando o método “treino intenso, redução do sono” foi incorporado por um período maior de tempo (3-semanas) (Marques et al., 2016b). No entanto, nos estudos mencionados acima, biópsias dos músculos não foram coletadas, e portanto, é desconhecido quais, se alguma, adaptações ocorreram em nível molecular.

Treino em Jejum

Outro regime bastante utilizado por atletas é o treinamento pela manhã após jejum noturno, com nenhuma ingestão de alimento antes ou durante o exercício. Este protocolo de treinamento é frequentemente referido como “treinamento em jejum” e tem sido associado com um aumento da capacidade oxidativa da musculatura. É importante notar que nesta situação as concentrações de glicogênio muscular podem estar normais ou altas, mas o glicogênio hepático está baixo.

Em um estudo de De Bock et al. (2008) homens moderadamente ativos foram submetidos a um programa de treinamento de resistência por 6 semanas, realizado no estado alimentado ou de jejum. Após as 6 semanas do período de treinamento, as proteínas do metabolismo de gordura aumentaram em grande quantidade no grupo jejum em comparação com o grupo alimentado. No entanto, nenhuma diferença foi encontrada nas taxas de oxidação de gordura entre os dois grupos, mas o consumo de CHO durante as sessões de exercício pode ter impedido qualquer alteração na oxidação de gordura. Adicionalmente, um estudo similar do mesmo laboratório de pesquisa, observou maior quebra de triglicérides intramusculares durante o exercício após um período de treino em jejum, em comparação com treinos no estado alimentado. Novamente, nenhuma diferença foi encontrada nas taxas de oxidação de gordura. No entanto, os autores declaram que a sessão de exercícios pós-treino pode ter sido realizada em uma intensidade abaixo da FATMAX e, desta forma, menores taxas de oxidação de gordura foram observadas (Van Proeyen et al., 2011).

Treinamentos e Dietas Ricas em Gordura  

Também foi sugerido que elevar os AGLs circulantes (através do consumo de uma dieta pobre em CHO e rica em gordura (LCHF)) pode aumentar a atividade das vias envolvidas no metabolismo de gordura. Em um estudo ilustrativo de Burke et al. (2017), atletas de elite de resistência foram submetidos a um período de treinamento de 3 semanas nas seguintes condições, alta disponibilidade de CHO, disponibilidade periódica de CHO ou uma LCHF. Após o período de 3 semanas, um aumento 2,5 vezes maior na oxidação de gordura foi observado no grupo LCHF (0,62 versus ~1,5g/min pré versus pós, respectivamente), em comparação com os outros grupos. No entanto, a oxidação de CHO foi significativamente comprometida no grupo LCHF assim como a economia de corrida durante uma corrida simulada, que poderia explicar o tempo de performance mais baixo neste grupo. Apesar da limitação de dados nesta área, isto sugere que a dieta LCHF deve ser evitada em atletas de elite durante eventos de resistência se a performance é essencial.

 

APLICAÇÕES PRÁTICAS E CONCLUSÃO

Parece que a utilização de diferentes estratégias podem ser aplicadas tanto para aumentar ou reduzir a oxidação de gordura durante o exercício. A ingestão de CHO antes do exercício foi mostrada por reduzir a oxidação de gordura em ~30%. Por outro lado, há uma evidência recente de que certos suplementos (por exemplo, a NZBC) podem aumentar a oxidação de gordura em ~20%. E ainda, reduzir o conteúdo de glicogênio muscular e/ou hepático, ou consumir uma dieta LCHF pode aumentar a oxidação de gordura entre 20-60% durante o exercício (Figura 2). Aumentar a dependência em relação à gordura durante o exercício também pode aumentar as adaptações induzidas pelos treinos nas atividades das vias que metabolizam a gordura na musculatura esquelética. No entanto, deve ser destacado que aumentar a oxidação de gordura durante o exercício não está associado com melhoras na performance. Portanto, métodos para aumentar o metabolismo de gordura deveriam ser incorporados nos programas de treinamento em momentos específicos da temporada do atleta, não associados com competições. 

Figura 2. Alterações hipotéticas na oxidação de gordura dependendo da intervenção nutricional empregada. LCHF = dieta pobre em carboidratos (CHO), rica em gordura. Áreas sombreadas mostram o potencial aumento de 20-60% na oxidação de gordura devido à dieta LCHF. VO2max, captação máxima de oxigênio. 

 

Tradução da Figura:

Oxidação de Gordura (g/min) // Intensidade do Exercício (% do VO2max)

Curva de oxidação de gordura típica (JEJUM)

Redução de 30%: pré-oferta de CHO

Aumento de 20%: ingestão de suplemento ou treino leve

Aumento de 20-60%: LCHF

 

Rebecca Randell é colaboradora do Gatorade Sports Science Institute; os pontos de vista expressos neste artigo são dos autores e não refletem necessariamente a posição ou política da PepsiCo, Inc.

 

REFERÊNCIAS

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