SSE #197: DA TEORIA AO PÓDIO: AVALIAÇÃO DO POTENCIAL DE APLICABILIDADE DAS PESQUISAS NA ÁREA DA NUTRIÇÃO NA PERFORMANCE
Publicado em
July 2019
Autor
Graeme L. Close, Andreas M. Kasper e James P. Morton
Temas
PONTOS CHAVE:
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- A nutrição esportiva é uma das disciplinas do esporte e ciências do exercício com maior crescimento e evolução atualmente, com pesquisas que vão desde a descoberta de uma via de sinalização com células sensíveis à um novo nutriente aos efeitos das bebidas esportivas na avaliação da percepção de esforço.
- Nutricionistas esportivos utilizam com frequência tanto a literatura clássica quanto a contemporânea para ajudar a guiar suas práticas, em última instância esperando que a pesquisa possa ajudar no desenvolvimento de performances vencedoras.
- O primeiro passo na tradução da teoria das pesquisas para a prática deveria sempre ser uma crítica bem estruturada do potencial de aplicabilidade da evidência científica existente.
- Apresentamos o esqueleto de uma estrutura operacional (a matriz da “Teoria ao Pódio”) que contém um checklist dos critérios para estimular a avaliação crítica da nutrição na performance relacionada a trabalhos de pesquisa.
- É a combinação da ousadia na reestruturação (como exemplo, a inovações na pesquisa) e a qualidade da execução (exemplo, a facilidade na administração de soluções práticas) que provavelmente vai possibilitar a transição da teoria ao pódio.
INTRODUÇÃO:
A ideia de testar intervenções nutricionais vem de muitos séculos atrás. No entanto, a nutrição esportiva tanto como disciplina acadêmica e também prática, foi originada principalmente da pesquisa realizada no final dos anos 60, seguindo uma série de estudos de referência que examinaram os efeitos do glicogênio muscular na capacidade do exercício e performance (Bergstrom & Hultman, 1966 a,b; Bergstrom et al., 1967; Hermansen et al., 1967). Desde estes artigos históricos, o campo da nutrição esportiva se desenvolveu significativamente com estudos examinando os efeitos da disponibilidade de nutrientes e auxílios ergogênicos na modulação da performance, recuperação, adaptações aos treinos e composição corporal (Thomas et al., 2016).
O objetivo dos profissionais da saúde deveria sempre ser a entrega de uma prática bem informada e baseada em pesquisa científica, mas existe frequentemente a necessidade do equilíbrio entre esperar os ensaios clínicos randomizados (ECRs) controlados revisados por colegas e a subsequente meta-análise, e a adoção inicial de métodos inovadores na tentativa de obter uma vantagem competitiva (Coutts, 2016). A disciplina da nutrição esportiva pode ser vista como altamente confusa e contraditória, com inúmeros exemplos reais onde achados mal interpretados de pesquisas foram utilizados para atualizar a aplicação prática. É indispensável para o crescimento e desenvolvimento da área da nutrição esportiva que uma crítica bem estruturada e revisada da evidência científica disponível seja conduzida anteriormente a sua utilização na prática.
O objetivo deste artigo do Sports Science Exchange SSE é fornecer ao nutricionista esportivo um modelo operacional rápido e eficiente para avaliar criticamente o potencial de aplicabilidade das informações, sempre que houver a aplicação destes dados das pesquisas na prática profissional (Close et al., 2019). O objetivo deste modelo não é criticar a metodologia geral de pesquisas, mas estimar a aplicabilidade direta e prática dos estudos pela utilização da nossa Matriz da “Teoria ao Pódio” (T2P) (Figura 1).
SCORE NEGATIVO: Cautela na SCORE 0: Pode ser um estudo apropriado SCORE POSITIVO: Estudo
utilização dos dados para para guiar a intervenção, mas análise apropriado para guiar a
aplicação na prática profissional de causalidade é necessária. prática.
-2 | -1 | 0 | +1 | +2 | |
Contexto | Células não-humanas, sem condições de exercícios. | Células não-humanas, com condições de exercícios. | Células humanas com condições de exercícios. | Participantes humanos, com avaliação da performance no exercício. | Participantes humanos com mensuração da performance e avaliação dos mecanismos. |
Participantes | Nível dos participantes não relatado. | Nível/tipo de treino e faixa etária inapropriados para o contexto necessário. | Nível/tipo de treino inapropriado (com critério definido) apesar de estar no grupo da faixa etária necessária. | Próximo do nível/tipo de treino e faixa etária apropriados (com critérios definidos). | Nível/tipo de treino e faixa etária relevantes (com critérios definidos). |
Desenho da Pesquisa | Ausência de grupo controle. Estudo não-cego da intervenção Não considerou tamanho da amostra. | Presença de grupo controle , porém estudo não-cego. Não considerou o tamanho da amostra. | Ensaio clínico randomizado controlado (ECR), com repetição de medidas ou desenho com ajuste do grupo. Presença de grupo controle, mas não-cego. Ausência de cálculo do tamanho da amostra, mas similar à pesquisa anterior. | ECR controlado, com repetição de medidas ou desenho com ajuste do grupo. Controlado com placebo cego. Cálculo do tamanho da amostra. | ECR controlado, com repetição de medidas ou ajuste do grupo. Controlado com placebo duplo-cego. Cálculo do tamanho da amostra. |
Controle | Sem referência ao controle dietético e de exercícios. | Citação dos métodos de controle dietético e de exercícios (autorrelato), sem comprovação de dados. | Citação dos métodos de controle da dieta e de exercícios (autorrelato), com comprovação de dados. | Fornecimento da dieta sem comprovação de dados. Citação do controle de exercícios. Sem reprodução em contexto real. | Fornecimento da dieta com comprovação de dados. Citação do controle de exercícios. Representativo no contexto real. |
Validade e Confiabilidade | Sem teste de familiarização ou confiabilidade dos dados e ferramenta para medidas de erros. Protocolo de exercícios sem representatividade no contexto real. | Teste de familiarização. Sem confiabilidade dos dados ou ferramenta para medidas de erros. | Teste de familiarização. Confiabilidade dos dados e ferramenta para medida de erros. Protocolo de exercícios sem representatividade no contexto real. | Teste de familiarização. Confiabilidade dos dados e ferramenta para medida de erros. Protocolo de exercícios com representatividade, mas baseado em ambiente de laboratório. | Teste de familiarização. Confiabilidade dos dados e ferramenta para medida de erros. Protocolo de exercícios representativo no contexto real. |
Análise dos
Dados |
Análise não relatada ou realizada. | Análise relatada, mas limitadas às estatísticas descritivas. | Análise relatada. Significância apropriada ou utilização de inferência baseada em magnitudes (IBM). | Análise relatada. Significância apropriada ou utilização de IBM. Inclusão da dimensão dos efeitos. | Análise relatada. Significância apropriada ou utilização de IBM. Inclusão da dimensão dos efeitos. Apresentação das respostas individuais ao tratamento com intervenção. |
Aplicação | Fora das limitações do orçamento. Implementação complexa. Chance pequena de conformidade. | Possibilidade de estar dentro das limitações do orçamento. Implementação complexa. Chance pequena de conformidade. | Dentro das limitações do orçamento. Implementação razoável. Certa chance de conformidade. | Implementação de baixo custo. Simples de ser implementada. Boa chance de conformidade. | Implementação de baixo custo. Implementação extremamente fácil. Nenhum risco de não-conformidade. |
Risco/
Benefício |
Alto risco de violação antidoping ou arriscado/Sem disponibilidade de dados sobre segurança. Potencial de prejudicar a performance pelo alto risco de efeitos colaterais adversos. | Mínimo risco de violação antidoping,
mas sem disponibilidade de dados sobre segurança. Potencial de prejudicar a performance por efeitos colaterais adversos. Dose ideal desconhecida. |
Mínimo risco de violação antidoping. Disponibilidade de dados sobre segurança. Alguns potenciais efeitos colaterais. Dose ideal sugerida, mas não evidente. | Mínimo risco de violação antidoping. Disponibilidade de dados sobre segurança. Baixo risco de efeitos colaterais. Dose ideal sugerida, mas não evidente. | Mínimo risco de violação antidoping. Disponibilidade de dados sobre segurança. Evidência sólida de não haver efeitos colaterais e dose ideal evidente. |
Calendário | Faixa etária não apropriada. Tempo para dosagem fora do ideal. Tempo insuficiente para as principais competições. | Faixa etária apropriada. Tempo para dosagem fora do ideal. Tempo suficiente para as principais competições. | Faixa etária apropriada. Tempo para dosagem fora do ideal, mas com possibilidade de ser eficaz. Tempo insuficiente para as principais competições. | Faixa etária apropriada. Tempo para dosagem fora do ideal, mas com possibilidade de ser eficaz. Tempo suficiente para as principais competições. | Faixa etária apropriada. Tempo ideal para dosagem. Tempo suficiente para as principais competições. |
Figura 1. Da Teoria ao Pódio – Matriz (T2P): uma estrutura operacional para avaliar o potencial de aplicabilidade de pesquisas em nutrição na performance. Para cada categoria, avalie o estudo em uma escala de -2 a +2 e depois some o score total. Um score positivo sugere que o trabalho tem potencial de aplicabilidade significativo, enquanto um score negativo sugere certo grau de cautela na tentativa de aplicar diretamente os achados à prática profissional. Deve-se ressaltar que esta matriz não tem nenhuma intenção em avaliar a qualidade da pesquisa por si só, mas simplesmente tem o propósito de avaliar a habilidade de aplicação do estudo em questão.
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CONTEXTO DA PESQUISA
A área da ciência dos esportes continua a crescer e pesquisas foram de encontro a investigação dos mecanismos fundamentais por trás da adaptação ao exercício e intervenções nutricionais que utilizam técnicas da biologia molecular (Close et al., 2016). Modelos de cultura de células e de camundongos são frequentemente utilizados para investigar as respostas fisiológicas (Gomez-Cabrera et al., 2008; Holland et al., 2016; Owens et al., 2015); no entanto, achados podem ou não ter aplicação ao exercício humano durante atividade física que trabalha todo o corpo. Quando a supressão ou ativação de uma via específica de sinalização é identificada, o que provavelmente vai gerar novos insights e questões científicas, deve-se levar em consideração que não necessariamente o treino de um atleta ou programa nutricional precise mudar imediatamente como consequência. É importante não apenas considerar o modelo/técnica in vitro, mas também se o estudo foi conduzido utilizando tipos de células humanas em oposição às células de camundongos, já que essas investigações de células não-humanas são frequentemente desenvolvidas para examinar os potenciais mecanismos das ações de adaptação e nunca tiveram a intenção de serem traduzidas diretamente para a prática. É crucial avaliar se o ensaio tem validade ecológica (ou seja, se os métodos de alguma forma replicam as condições esperadas num contexto real) quando se avaliar a habilidade de aplicabilidade do estudo. Considerações iniciais e cuidadosas do contexto da pesquisa portanto, fornecem a plataforma para avaliar futuramente o potencial de aplicabilidade em uma situação esportiva específica.
CARACTERÍSTICAS DOS PARTICIPANTES
Nos dias de hoje, com certa frequência encontramos muitas ambiguidades na descrição das características fisiológicas e do estado geral de treinamento dos participantes. Descrições como “bem-treinados”, “de elite” e “de alto nível” são frequentemente utilizadas de forma aleatória, citadas incorretamente, e às vezes fornecidas sem qualquer detalhe em relação ao treino habitual ou estado de saúde, e medidas que relatem o preparo físico dos participantes. Jeukendrup et al. (2000) inicialmente forneceu um modelo padrão objetivo para a categorização de ciclistas dependendo de critérios qualitativos (por exemplo, ranking, total dos dias de corridas por ano, frequência dos treinos) e quantitativos (potência máxima, consumo máximo de oxigênio (VO2max), economia). A ideia de definir padrões habituais e fisiológicos como estes pode ser pertinente em todos os esportes de resistência; no entanto, em cenários com esportes de equipes (times), pode ser prático simplesmente classificar os indivíduos como amadores, semiprofissionais ou profissionais dependendo da graduação da competição que eles participam. Autores deveriam descrever os participantes utilizando a maior quantidade de dados mensuráveis possível e onde estes dados não forem citados, os resultados devem ser tratados com certo grau de precaução dada a vasta diferença nas respostas aos exercícios entre participantes treinados e não treinados (Bergman & Brooks, 1999). No contexto da performance, portanto, é possível que os efeitos na melhora da performance de uma intervenção específica (por exemplo, suco de beterraba) sejam anulados em participantes que treinam em comparação aos que não treinam (Wilkerson et al., 2012). Desta forma, a eficácia de qualquer intervenção nutricional deveria ser investigada na população específica na qual a intervenção tem a intenção de ser utilizada. A este respeito, bons exemplos incluem o estudo da eficácia de dietas cetogênicas em atletas de marcha atlética com padrão olímpico (Burke et al., 2017) ou o trabalho do nosso grupo que examinou a utilização de glicogênio em jogos pelos jogadores profissionais de Rugby durante a rodada competitiva (Bradley et al., 2017).
DESENHO DA PESQUISA
O “padrão ouro” no desenho de pesquisas é geralmente considerado o desenho crossover randomizado contrabalançado, com repetição de medidas que incorpora intervenções com duplo-cego e controle com placebo. Tipicamente, tais pesquisas também iriam incluir testes de familiarização adequada em conjunto com o controle de todas as ameaças para a validação interna, como os efeitos de diferentes aquecimentos, exercício prévio, nutrição prévia, condições consistentes do laboratório, encorajamento verbal etc. Por exemplo, na avaliação dos efeitos de uma nova bebida esportiva ou performance do exercício, os mesmos participantes são testados duas vezes, e a bebida em teste e a bebida controle são compatíveis em relação ao gosto, cor e sabor. Assumindo que a dieta anterior ao teste e os controles do exercício sejam apropriados, um teste válido e confiável de performance, e a adoção de procedimentos estatísticos cabíveis adequados, este desenho deve permitir aos pesquisadores averiguarem os verdadeiros efeitos da bebida no teste da performance com a ausência de influência dos pesquisadores e/ou participantes e efeitos placebo (Clark et al., 2000, Jones et al., 2016). Muitos estudos, contudo, podem não ser capazes de utilizarem este “padrão ouro” do desenho de pesquisa. Por exemplo, no caso de testes sobre os efeitos de alimentos na performance atlética (por exemplo, o consumo de alta quantidade de gorduras em comparação com alta quantidade de carboidratos (CHO)), o desenho da pesquisa pode não utilizar a abordagem controle com placebo duplo-cego já que tanto os pesquisadores quanto os participantes estão cientes dos alimentos consumidos pelos indivíduos participantes (Burke et al., 2017). De maneira similar, quando se examinar os efeitos da restrição de CHO nas adaptações aos treinos e performance, um modelo controlado com placebo duplo-cego pode não ser utilizado (Marquet et al., 2016) a não ser que a oferta da quantidade de CHO disponível tenha sido manipulada tornando suas características compatíveis em relação ao gosto, cor e sabor (Morton et al., 2009). Apesar da necessidade de questionar se a intervenção alimentar verdadeiramente causou efeito na performance, ou se o efeito foi causado por influência cognitiva em relação a qualquer abordagem alimentar específica, reconhecemos o poder do “placebo” na área da prática aplicada. Na pesquisa de nutrição esportiva, é frequentemente difícil evitar totalmente as interferências cognitivas (ou seja, a crença no efeito) já que algumas intervenções podem ser óbvias (como exemplo, os efeitos da cafeína são difíceis de mascarar e a maioria dos atletas está ciente dos efeitos da cafeína na melhora da performance). Em alguns cenários de pesquisa, um desenho crossover contrabalançado, com repetição de medidas, simplesmente não é possível devido às questões que podem surgir com períodos de eliminação (wash out) necessários ou efeitos repetitivos de competições, como nas avaliações da suplementação habitual e auxílios ergogênicos (por exemplo, carnitina, creatina, beta-alanina, vitamina D) na performance muscular e de todo o corpo (Owens et al., 2014; Sale et al., 2011; Tomcik et al., 2018; Wall et al., 2011). Nestes casos, nas investigações pode-se optar por utilizar um modelo de ajuste do grupo e nestas situações, é essencial que os grupos sejam alocados aleatoriamente em grupos de tratamento que são compatíveis com as características fisiológicas de referência (como idade, estatura, composição corporal, perfil fisiológico etc.). Como muitas coisas na ciência, o delineamento perfeito da pesquisa não existe. Apesar disso, os profissionais devem considerar as nuances discutidas acima antes de tirar qualquer conclusão do potencial de aplicabilidade do estudo em questão.
CONTROLES DA DIETA E EXERCÍCIOS
Apesar das diretrizes publicadas para a padronização de pesquisas (Jeacocke & Burke, 2010), a literatura frequentemente falha em controlar objetivamente a dieta habitual ou relatar quaisquer controles utilizados na dieta. Com certeza, também há discrepâncias presentes envolvendo o real fornecimento dos controles dietéticos, variando do relato do próprio indivíduo, pesquisadores que preparam alimentos frescos e/ou empresas de preparação de refeições que fazem as dietas e as entregam. Além disso, também pode ser útil relatar e padronizar os exercícios durante os dias anteriores ao teste experimental, especialmente em situações que podem levar a diferenças na disponibilidade de glicogênio muscular pré-exercício e consequentemente à uma performance alterada. Há, claro, vantagens e desvantagens em muitos dos métodos comuns de padronização da dieta apontados acima, incluindo custo e facilidade da intervenção, mas também a validade ecológica aos participantes da pesquisa. O jejum é frequentemente utilizado como controle em estudos de intervenção dietética devido ao fato de que se alimentar perto do exercício pode significativamente alterar as respostas metabólicas antes, durante e após o exercício (Bartlett et al., 2013; Horowitz et al., 1997; Lane et al., 2013; Widrick et al., 1993). No entanto, é improvável que atletas de elite iriam competir ou iriam se submeter a sessões consecutivas de treinos aeróbicos e de resistência em jejum ou sem ingestão de energia entre as sessões; novamente, deve-se ter cautela na interpretação de pesquisas contendo participantes em jejum e atletas com a intenção de competir logo após se alimentarem. Finalmente, os profissionais deveriam estar cientes de que alguns estudos restringem propositalmente o nutriente de interesse, por exemplo o nitrato (Lane et al., 2014) ou os polifenóis (Bell et al., 2014) na tentativa de garantir uma concentração consistente pré-teste da substância de interesse. Enquanto esta abordagem soa científica, deve-se ter um pouco de cautela na aplicação dos resultados relatados, pois os atletas em seus hábitos cotidianos podem na verdade já consumir uma dieta naturalmente rica no composto de interesse. Por essas razões, nós recomendamos que os profissionais avaliem cuidadosamente desenhos de pesquisa e protocolos alimentares em relação às práticas nutricionais, cargas dos treino e práticas para treinos em organizações que sejam inerentes ao seus esportes específicos. E potencialmente, desenhos de estudos futuros devem considerar a utilização de condições consideradas como “a melhor prática nutricional” no contexto de seus “ambientes reais” para avaliar a verdadeira magnitude da intervenção.
VALIDADE E CONFIABILIDADE DOS PROTOCOLOS DE EXERCÍCIOS E TESTES DE PERFORMANCE
A validade ecológica, confiabilidade e contexto do “mundo real” dos protocolos de exercício são frequentemente esquecidos em pesquisas, o que altera a habilidade de interpretar e traduzir os dados para a prática. Um exemplo disto é o modelo dos extensores do joelho em uma das pernas (Andersen et al., 1985), que tem sido utilizado extensivamente em pesquisas do metabolismo do exercício para avaliar o controle local do metabolismo do músculo e adaptação aos exercícios do treino. De uma perspectiva mecanicista, este modelo é vantajoso, já que o exame das respostas pode ser conduzido no mesmo indivíduo com a perna em descanso como situação controle. No entanto, a modalidade da utilização de uma única perna falha em replicar precisamente o exercício in vivo, dado que estes modelos têm massa muscular limitada, função cardíaca baixa e uma resposta hormonal diminuída (Helge et al., 2007). Vale ressaltar que os estudos de dose-resposta avaliando a dose ideal de proteína na estimulação da síntese de proteína muscular sugerem que a dose de proteína total é efetivamente duplicada (por exemplo, 20 a 40 gramas de ingestão de proteína no pós-exercício) quando utilizando protocolos de treino de resistência para todo o corpo (Macnaughton et al., 2016) em comparação com protocolos de exercícios unilaterais (Moore et al., 2009; Witard et al., 2014).
Além da validade ecológica, existe também a necessidade de se considerar cuidadosamente a confiabilidade de qualquer teste de performance do exercício assim como a inclusão de qualquer teste de familiarização. No contexto dos testes de performance do tipo de resistência, pode-se também debater se o participante deveria ter acesso a qualquer informação interna (exemplo, a taxa cardíaca) ou externa (exemplo, a força realizada ou velocidade de corrida) durante o teste (Edwards & McCormick, 2017), assim como a validade dos testes de tempo versus testes de capacidade do exercício (Currell & Jeukendrup, 2008; Karsten et al., 2018). Por exemplo, no caso do Ciclismo Profissional de Estrada, poderia ser discutido se os verdadeiros efeitos de qualquer intervenção nutricional ou auxílios ergogênicos deveriam ser sempre avaliados com acesso a informações externas, já que os corredores têm acesso contínuo ao medidor de potência, dados da taxa cardíaca e feedback verbal da equipe de suporte. Adicionalmente, a utilização de testes de tempo e testes de capacidade do exercício poderia ser considerada como válida em relação às medidas de performance em ambos os casos, já que ambas as situações ocorrem na forma de testes por estágios de tempo e a habilidade de responder aos “ataques” no alpinismo em montanhas, respectivamente. Precisamos nos lembrar que o ambiente controlado e calmo do laboratório, com temperatura controlada não é normalmente um representante fiel da arena dos esportes de elite. Será que os efeitos da cafeína na motivação seriam os mesmos em um ambiente calmo de laboratório em comparação ao entrar no campo do estádio “Twickenham” (Londres) para uma final de copa do mundo de Rugby com a presença de 80.000 espectadores?
ANÁLISE E APRESENTAÇÃO DOS DADOS
Com frequência, um dos componentes mais contraditórios da nutrição na performance relacionado à pesquisa é a maneira em que os dados têm sido analisados e apresentados. No campo da pesquisa aplicada à performance, existe uma tendência recente em adotar a abordagem de inferências baseadas na magnitude (Batterham & Hopkins, 2006) em oposição à mais tradicional como testes baseados em probabilidade e desta forma, é importante que os profissionais estejam familiarizados com as vantagens e desvantagens de ambos os métodos. Essencialmente, pesquisadores deveriam fornecer uma lógica e justificativa mais claras do tamanho da amostra escolhido (frequentemente acompanhado pelo cálculo da potência) e razões para as escolhas das análises estatísticas. Finalmente, a abordagem da apresentação dos dados pode também influenciar muito como os resultados são avaliados e interpretados pelos leitores. Por exemplo, a apresentação das médias do grupo e erro padrão (em oposição ao desvio padrão) não fornece uma representação verdadeira da variabilidade entre as respostas dos indivíduos, mas pesquisadores escolhem com frequência representar a variabilidade utilizando erro padrão (especialmente no formato gráfico) por questões visuais (Morton, 2009).
Já que os profissionais geralmente seguem a aplicação das intervenções em atletas individualmente, avaliações mais ricas dos dados deveriam ser realizadas, e as diferenças individuais representadas e visualizadas quando possível, especialmente quando a pesquisa foi conduzida em amostra pequena. Por exemplo, em um estudo recente do nosso laboratório examinando o efeito da disponibilidade do glicogênio muscular na capacidade de resistência, observamos que a capacidade média do exercício foi aumentada em 60 minutos com concentração alta pré-exercício de glicogênio em comparação com a concentração moderada (exemplo, 600 vs 300 mmol/kg de peso seco) (Impey et al., 2016). No entanto, o aumento da magnitude individual no tempo até a exaustão variou de 4 minutos a 13 minutos. Claramente, a avaliação das respostas individuais pode sofrer perdas em relação à interpretação onde apenas as médias do grupo são apresentadas.
APLICAÇÕES PRÁTICAS
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- Considere o potencial de aplicabilidade e o contexto no qual os dados foram coletados.
- Investigue as características dos participantes dos estudos para decidir se a pesquisa tem aplicabilidade direta no seu próprio contexto.
- Estude totalmente o desenho da pesquisa e considere se foi na verdade a intervenção nutricional que causou um efeito.
- Avalie se a pesquisa utilizada adequa controles da dieta e/ou dos exercícios para atribuir confiavelmente diferenças na intervenção de escolha.
- Pesquise por quaisquer questões de validação e confiabilidade nos protocolos de exercício e testes de performance escolhidos, prestando atenção particular ao ambiente onde o estudo foi conduzido.
- Reflita em como a análise dos dados foi conduzida, como os dados foram apresentados e procure por valores com diferenças individuais e valores de desvio padrão.
RESUMO
Apesar de relativamente simples em conceito, a aplicação das pesquisas na prática profissional não é sempre um processo inequívoco. De fato, os esportes de elite são dinâmicos, imprevisíveis e frequentemente confusos, e nenhum deles pode ser interpretado por uma Análise de Variância ANOVA do tipo two-way (de duas vias) ou ser previsível de acordo com ambientes controle de laboratórios. Apesar da busca contínua e demandas frequentemente precipitadas em busca da mais incrível vantagem competitiva, consideramos que o ponto inicial para o profissional de saúde que se informa por meio de pesquisas deveria sempre ser uma avaliação crítica do potencial de aplicabilidade das evidências científicas disponíveis. De maneira clara, precisamos olhar além dos resumos dos artigos, do tweet de 140 caracteres e dos últimos infográficos para verdadeiramente avaliar o rigor científico e potencial de aplicabilidade dos estudos de pesquisa relacionados com a nutrição na performance. A utilização da Matriz T2P (Figura 1) pode ajudar o profissional a avaliar pessoalmente o trabalho de pesquisa, aumentando sua própria confiança na intervenção que eles estão para implementar, a qual pode resultar em última instância numa consulta mais positiva com o atleta e aumentar as chances de uma intervenção efetiva. É prontamente reconhecido que o conteúdo e indicadores deste modelo não são minuciosos. Ao invés disso, o objetivo deliberado foi fornecer uma ferramenta de avaliação eficiente com rapidez que possa ser aplicada imediatamente pelos profissionais que com grande frequência operam sob restrição enorme de tempo inerente aos esportes de elite. Subsequente a avaliação da pesquisa existente, nós também encorajamos os profissionais que conduzam uma pesquisa baseada em campo (por exemplo, relatórios de caso ou estudos com amostras menores) com o mesmo grau de rigor científico e medidas precisas requisitadas nos ECRs. Por fim, é a combinação da coragem na reestruturação (como exemplo, inovações nas pesquisas) e a qualidade da execução (exemplo, facilidade na administração das soluções práticas) que mais provavelmente vai possibilitar a transição da teoria ao pódio.
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